Privatização da SABESP: por trás da truculência e agilidade na aprovação do PL
Privatização da Sabesp reflete disputa mundial pela água
Publicado 08/12/2023 - Atualizado 04/06/2024
Após o episódio de truculência da Política Militar a mando do governador Tarcísio, em que se espancaram trabalhadores, representantes de movimentos sociais e estudantes, o Projeto de Lei da privatização da SABESP foi com 62 votos a favor. O PL do governador bolsonarista Tarcísio de Freitas (Republicanos) foi aceito por deputados após liberação de emendas. Violência, rapidez, truculência são marcas de todo o processo de aprovação do texto.
Com a população fora das galerias da Assembleia Legislativa do Estado de São Paulo – ALESP e com uma atmosfera impregnada de gás de pimenta, a bancada privatista impôs seu cheiro de vitória, na calada da noite.
No entanto, para a população de 371 municípios atendidos pela Companhia de Saneamento do Estado de São Paulo (SABESP), 28,5 milhões de pessoas atendidas com abastecimento de água (64% da população do estado) e 25,2 milhões com esgotamento sanitário (56,7% da população do estado), os dados apresentados no site da companhia mostram que os danos da privatização serão mais ácidos e corrosivos do que a pimenta lançada sobre os manifestantes.
O fato mais explícito nesse processo é a capacidade da empresa de valorizar o dinheiro nela investido. A Sabesp é a empresa mais lucrativa das companhias de saneamento do país, incluindo os parcos 6% que a iniciativa privada tem e todas as autarquias e companhias de sociedade mista (pública e privada) do país.
Hoje, 08 de dezembro de 2023, as ações negociadas na B3, a bolsa de valores de São Paulo, estão em R$ 67,94; com um volume médio de negociação dos últimos 2 meses de aproximadamente, 177.190.000. Ou seja, se buscarmos uma média da negociação das ações e multiplicarmos pelo volume negociado, teremos um número astronômico. No dia 16 de novembro de 2023, as ações foram negociadas à R$ 63,50.
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Outro dado importante é a capacidade de receita atingida, que ilustra o interesse de setores financeiros. Dentre as 8 companhias estaduais, a SABESP atinge R$ 21,1 bilhões em receita, seguidas da COPASA (R$ 6,1 bilhões), SANEPAR (R$ 5,5 bilhões), CEDAE (R$ 6,1 bilhões). A concentração desigual espacial de renda, populacional característica da ocupação territorial brasileira é evidenciada nesses dados, em que estados da região sudeste absorvem um contingente populacional. Isso reflete na espacialização de onde há maiores ligações de água e esgoto, bem como a capacidade de extrair maiores rendas.
É válido acrescentar o histórico de financiamento das companhias estaduais. No início dos anos de 1970, o BNH (Banco Nacional de Habitação, extinto em meados dos anos 80) era um importante investidor dos programas de saneamento do país, mas, nos anos de 1990, em seu intento de privatização, o governo federal passou a reduzir e cortar investimentos em saneamento básico.
Somente em 2007, com investimentos do Programa de Aceleração do Crescimento – PAC tivemos rubrica para investimento e amplitude no setor. Isso posto para salientar que, mesmo com essas descontinuidades nas fontes de investimentos, ainda assim, algumas empresas foram autossuficientes em gestão de recursos e expansão de rede, deixando à nocaute o discurso da ineficiência. Os cortes e descontinuidades de financiamento, porém, reduziram a capacidade de amplitude do saneamento.
A capacidade de retorno ao patrimônio (capacidade de uma empresa de gerar lucro) – comparada ao retorno proporcionado por investimentos em bancos – também demonstravam a capacidade de valorização da Sabesp.
O indicador de retorno sobre patrimônio líquido (descontados os impostos) e o lucro líquido (descontados os impostos) é esclarecedor, cuja sigla é ROE. A SABESP, em dados coletados 10,5%[1], também só é comparável a bancos, tais como o Bradesco 8,68%[2]. Um quesito importante é a capacidade dos portifólios de investimentos de fundos de investimentos e bancos (misto e de investimentos), uma vez que a segurança de retorno, seja em crédito a longo prazo é efetiva e sua capacidade de retorno.
É esse cenário que o saneamento público nacional que se inserem as ameaças de setores financeiros com investimentos crescentes em atividades que envolvem bens naturais, metamorfoseando por modelagens e precificações em recursos e ativos. Contextualizando, dessa maneira, em escala global as movimentações e buscas de mercados ou a criação deles. A celeridade do governo Tarcísio em privatizar está relacionada a essa oportunidade de investimentos que os setores do capital buscam. A experiência da privatização já é explicita no Brasil, basta ver o setor elétrico e os outros serviços, que são direito da população e dever do Estado, como explicita a própria constituição do estado de São Paulo. A população sofrerá cada vez mais, como sabemos, aumento de tarifas distanciamento do atendimento e precariedade.
[1] https://www.fundamentus.com.br/detalhes.php?papel=SBSP3
[2] https://www.infomoney.com.br/cotacoes/b3/acao/bradesco-bbdc3/