Atingidas participam de plenária em preparação para a Marcha das Margaridas

Ato vai reunir 100 mil militantes em Brasília (DF) para defender direitos e lutar por programas de proteção para as mulheres

Na noite da última quinta-feira, 27, as atingidas e mulheres da coordenação nacional do MAB estiveram reunidas virtualmente na Plenária das Mulheres Atingidas Rumo à Marcha das Margaridas, em preparação para a 7ª edição da Marcha, que acontecerá durante os dias 15 e 16 de agosto, em Brasília (DF).

Esse que é o maior ato político de mulheres da América Latina, reunirá 100 mil “Margaridas”, entre mulheres da cidade, do campo, da floresta e das águas sob o lema “Pela Reconstrução do Brasil e pelo Bem Viver”. 

A pauta da Marcha das Margaridas foi entregue ao governo federal e ao presidente da Câmara dos Deputados no dia 21 de junho. O MAB também contribuiu com a construção do documento, incluindo pontos relacionados à reivindicação das atingidas. Entre eles está a criação da Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas (PNAB) e da Política de Proteção e Segurança das Populações Ribeirinhas; a criação da Secretaria de Políticas Socioambientais e de Segurança das Populações Atingidas, que se trata de um novo organismo de participação no Ministério de Minas e Energia, com capacidade de responder aos desafios do desenvolvimento social e direitos das populações atingidas.

Também foram mencionadas a criação de um fundo nacional para reparação, proteção, segurança e desenvolvimento de territórios atingidos e a ativação do Programa de Revitalização e Alívio da Pobreza com Produção de Energia Renovável de bases comunitárias para proporcionar uma renda mínima para eliminação da pobreza a milhares de famílias urbanas e rurais, por meio da produção nacional de energia e alimentos. Por fim, as mulheres atingidas reforçaram todas as reivindicações populares e ações de governo para combate à fome e à violência contra as mulheres.

Marcha das Margaridas em 2015. Foto: Naiara Pontes

O documento geral da pauta traz os anseios e as prioridades apontadas pelas Margaridas, e suas propostas estão organizadas em 13 eixos temáticos, sendo estes: Democracia participativa e soberania popular; Poder e participação política das mulheres; Vida livre de todas as formas de violência, sem racismo e sem sexismo; Autonomia e liberdade das mulheres sobre o seu corpo e a sua sexualidade; Proteção da Natureza com justiça ambiental e climática; Autodeterminação dos povos, com soberania alimentar, hídrica e energética; Democratização do acesso à terra e garantia dos direitos territoriais; Direito de acesso e uso da biodiversidade, defesa dos bens comuns; Vida saudável com agroecologia e segurança alimentar e nutricional; Autonomia econômica, inclusão produtiva, trabalho e renda; Saúde, Previdência e Assistência Social pública, universal e solidária; Educação Pública não sexista e antirracista e direito à educação do e no campo; e Universalização do acesso à internet e inclusão digital.

Além das mulheres organizadas do MAB, também participaram da Plenária Mazé Morais, Secretária de Mulheres Trabalhadoras Rurais da Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura – CONTAG e Júlia Margarida, Secretária de Energia na Federação Regional dos Urbanitários do Nordeste – FRUNE e coordenadora do Coletivo Nacional de Eletricitários – CNE que integra a Plataforma Operária e Camponesa da Água e da Energia – POCAE.

De acordo com Mazé Morais, nos últimos três anos, uma série de atividades formativas foram realizadas por todo o Brasil, a partir de cadernos de textos que trazem a centralidade das pautas das Margaridas, que culminará na grande Marcha nos dias 15 e 16 na Marcha das Margaridas. Segundo Mazé, “A Marcha não é apenas as 100.000 mulheres que estarão em Brasília, a Marcha é muito mais, é um processo de formação, organização e articulação desde a base!”

Mazé enfatizou a força da mobilização das Margaridas de todo o Brasil, neste momento histórico. “Diferentemente da Marcha realizada em 2019, que teve caráter de resistência, a Marcha de 2023 representa a reconstrução do Brasil, a retomada de políticas públicas, das conquistas que foram arrancadas e sucateadas nos últimos anos. Precisamos recuperar nossos direitos e construir outras políticas públicas para as Margaridas”.

Foto: Naiara Pontes

Para Júlia Margarida, as mulheres resistiram de forma única nos últimos anos, após o Golpe de 2016, e a Marcha será o momento em que elas poderão mostrar a sua unidade, sua garra e sua luta, tendo em vista os avanços que são necessários, agora com a democracia plena restaurada no país. “Estaremos em Brasília levando nosso recado, lutando pelos direitos das mulheres, por qualidade de vida, por desenvolvimento sustentável”, afirmou.

Em sua fala, Júlia também denunciou o cenário crítico em que se encontra o setor elétrico brasileiro, quase que totalmente privatizado, com a recente entrega da Eletrobras à iniciativa privada. “A privatização da Eletrobrás representa um prejuízo enorme para a sociedade, para nós mulheres. E a realidade mostra que as mulheres são as que mais se preocupam em pagar as contas de luz e água, portanto, a privatização as afeta diretamente. Por isso, os sindicatos, o MAB e a POCAE estão na luta pela reestatização da Eletrobras,” destacou a dirigente. Julia ainda alertou para os perigos das promessas de energia sustentável e os projetos que vem avançando pelo interior do Brasil, que podem seguir reproduzindo um modelo energético que viola direitos.

“Nós, mulheres, temos a capacidade da construção coletiva, temos que seguir lutando contra qualquer tipo de descriminação de preconceito, machismo, sexismo, temos que sempre levar essas bandeiras e estarmos vigilantes”, concluiu Julia.

Daiane Hohn, da Coordenação Nacional do MAB, apontou as tarefas centrais das mulheres atingidas na construção da Marcha das Margaridas, ao levar a mensagem do MAB de como a questão energética afeta a vida das mulheres, do campo e da cidade, mostrando a contradição do modelo e apontando a soberania energética como caminho para sua superação e para a construção da nova sociedade. Além disso, é tarefa das mulheres atingidas contribuir para a pauta do feminismo popular, da igualdade de gênero, de politicas publicas que protejam a vida das mulheres, que garantam renda e autonomia, além do reconhecimento enquanto sujeitas atingidas.

“Precisamos apontar que é preciso baixar a taxa de juros, para termos empregos, investimentos em saúde, educação, creche, para termos dignidade. Nosso papel é apontar que a luta segue contra o fascismo e pelo fortalecimento da democracia”, afirmou Daiane. A coordenadora enfatizou a importância da prática da pedagogia do exemplo, do fortalecimento da unidade, e concluiu: “Precisamos demonstrar que só a luta, a pressão popular, faz as transformações necessárias. Estaremos em marcha para pautar o Estado, para pautar o governo”.

Programação

Durante os dois dias haverá uma intensa programação na capital federal, com protagonismo das mulheres lutadoras vindas de todos os cantos do país. Na manhã do dia 15, será realizada homenagem a Margarida Alves no plenário do Senado Federal e, paralelamente, estarão acontecendo uma série de atividades, como oficinas, atividades auto gestionadas, plenárias e painéis, dentre eles um painel sobre o lema da Marcha, focando em políticas públicas e outro sobre questão climática. Ao final do primeiro dia de programação, haverá a solenidade de abertura oficial da Marcha, às 17:00. Ao raiar do dia 16, as Margaridas se colocarão em Marcha pelas ruas de Brasília, rumo a Esplanada dos Ministérios, onde esperam ser recebidas pelo presidente Lula.

Quem foi Margarida Alves?

A Marcha tem como força inspiradora a luta de Margarida Maria Alves, uma mulher trabalhadora rural nordestina e líder sindical, que rompendo com padrões tradicionais de gênero ocupou, por 12 anos, a Presidência do Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Alagoa Grande, na Paraíba. 

Por lutar pelo direito à terra, pela reforma agrária, por educação, por igualdade e por defender direitos trabalhistas e vida digna para trabalhadoras e trabalhadores rurais, Margarida Alves foi cruelmente assassinada na porta da sua casa, no dia 12 de agosto de 1983.

Seu nome se tornou um símbolo nacional de força e coragem cultivado pelas mulheres e homens do campo, da floresta e das águas. É em nome dessa luta que a cada quatro anos, no mês de agosto, milhares de Margaridas de todos os cantos do País marcham em Brasília, num clamor por justiça, igualdade e paz no campo e na cidade.

De Margarida nos tornamos sementes, e nós, atingidas por barragens, nos organizamos e lutamos por nossos direitos e por água e energia com soberania, distribuição da riqueza e controle popular.

Somos todas atingidas!
Somos todas Margaridas!
Mulheres, água e energia não são mercadorias!
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