Nota do MAB sobre o acordo para reparação dos danos individuais dos atingidos pela ArcelorMittal, em Itatiaiuçu (MG)

O acordo assinado hoje, 7, representa uma conquista para os atingidos em questões relacionadas à reparação de danos que dizem respeito à moradia, trabalho e renda e danos morais

Atingidos e atingidas pelo acionamento do Plano de Ação de Emergência para Barragens de Mineração (PAEBM) da ArcelorMittal em Itatiaiuçu (MG), participam, hoje (7), da assinatura do Termo Complementar (TAC) para a reparação dos danos individuais sofridos. A live do evento será transmitida nas páginas do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) e da AEDAS, Assessoria Técnica Independente de Itatiaiuçu, a partir das 18h, no Facebook (@mabbrasil e @aedasit).

A assinatura do acordo é uma conquista histórica dos atingidos por barragens, fruto da nossa organização e luta. Uma das primeiras conquistas, que possibilitou as demais, foi a construção do plano de reparação, construído pelos próprios atingidos acompanhados da Assessoria Técnica Independente, com previsão de ações de reparação, parâmetros mínimos, matriz de danos com valores pra cada tipo de dano. Foi essa a construção base para o inicio da negociação, e não uma proposta a partir dos interesses da empresa causadora do dano. Este e outros pontos conquistados devem ser um exemplo para os outros casos de ameaças ou rompimento de barragens no Brasil.

O TAC que será assinado hoje é o primeiro acordo na reparação dos atingidos pela PAEBM e trata dos danos individuais homogêneos. A proposta elaborada pelos atingidos tem três eixos de reparação: (a) moradia, propriedade e uso de imóveis, (b) danos ao trabalho e renda e (c) danos morais e imateriais. Os danos coletivos e difusos serão tratados em um segundo acordo.

Moradia, propriedade e uso de imóveis

Um dos avanços do processo de reparação é o fato de que os atingidos não perderem suas casas ou terrenos que estão desocupados por estarem na Zona de Autossalvamento (ZAs). Esses moradores têm o direito de receberem uma casa em valores melhores ou iguais ao que eles tinham antes, ou um valor correspondente a este imóvel, mas continuam donos destes imóveis que ainda existem, mas que tiveram uso inviabilizado. Ou seja, quando houver uma liberação de uso dessa área, as pessoas poderão voltar a morar em suas antigas casas. Esse é a primeira vez que os atingidos pelo acionamento do PAEBM conquistam que a indenização pela moradia não implica na aquisição da moradia pela empresa dona da barragem. No caso dos acordos de Barão de Cocais (MG) e do vilarejo de Macacos, distrito de São Sebastião das Águas Claras (MG) os moradores foram indenizados, mas perderam a propriedade das suas casas na ZAs.

Outra conquista do acordo foi o reconhecimento de inquilinos, caseiros e pessoas que faziam o uso de propriedades que estão na ZAs. Mesmo não sendo proprietárias, elas também terão direito a essa reparação por terem perdido a moradia.

Além de repor a propriedade, a mineradora também irá pagar pelo dano do uso. Todo esse período de esvaziamento da casa será ressarcido pela impossibilidade de utilização.

Danos ao trabalho e renda

O acordo prevê a possibilidade do pagamento mensal não só para as pessoas que foram retiradas de casa, que já recebem o auxílio. A partir da assinatura do TAC, o pagamento mensal vai ser expandido para toda a comunidade atingida, no valor de 2,5 salários mínimos durante 1 ano. Essa medida propicia a reativação da renda coletiva da comunidade, fomentando a recuperação econômica do território.

Além disso haverá a reposição individual pela perda de renda de todos trabalhadores formais e informais, agricultores, comerciantes. Esta será calculada, na maioria dos casos, pelo prazo de 48 meses, levando em consideração um prazo para a recomposição da atividade econômica de cada um dos atingidos.

Danos morais e imateriais

Outra conquista é o pagamento de individual e não por núcleo familiar. Esse ponto é importante, porque o pagamento está relacionado aos danos que as pessoas sofreram durante o processo do plano de emergência: deslocamento compulsório, danos psicológicos, sociais, de saúde e outros que cada indivíduo sofreu.

Todos esses avanços têm a ver com os passos importantes que foram dados durante a construção do processo de reparação, sendo o principal deles a luta coletiva dos atingidos, com união e enfrentamento, sem abaixar a cabeça para a empresa.

O conhecimento e as experiências do MAB junto dos atingidos permitiu que não fossem cometidos os mesmos erros de outros lugares. A condução e o formato que o Ministério Público, o Ministério Público Federal e o Ministério Público Estadual de Minas Gerais adotaram também foram importantes. Vale destacar ainda a atuação da Assessoria Técnica e o trabalho de levantamento de danos, a sistematização das ações de reparação, os fundamentos técnico e jurídico, e acompanhamento dos atingidos que foi fundamental para essas conquistas.

Prática de violação de direitos

A luta e a construção coletiva feita pelos atingidos acompanhados de assessoria técnica independente possibilitou avanços consideráveis se comparado com outros casos de acionamento de PAEBM. A mineradora, porém, negou direitos importantes e essenciais para a reparação integral, praticando valores injustos de indenização, não reconhecendo a desvalorização dos imóveis nas comunidades atingidas e negando o agravamento dos danos sofridos pelas mulheres e negros.

É notório e simples o reconhecimento da desvalorização dos imóveis, já que só de estar perto de uma barragem com risco de rompimento, ele perde seu valor comercial. A empresa se negou a reconhecer esse ponto. Como os proprietários já sofrem com a desvalorização dos seus imóveis, a indenização por este dano deveria ser calculada e paga.

A ArcelorMittal também negou os danos agravados pela situação social das pessoas, tanto os danos econômicos, quanto os morais. Deveria uma haver política especial de indenização para as mulheres e negros que vão enfrentar maiores desafios na possível recolocação profissional e na retomada de suas atividades que os demais moradores. Nesse ponto, a empresa perpetuou a postura que as mineradoras têm diante dos atingidos: posições racistas, machistas e a negação das vulnerabilidades da população.

Também houve a dificuldade de acordar os valores com a empresa em todos os pontos, já a mineradora tentava usar os piores casos como referência nas contrapropostas. Em danos morais, por exemplo, uma pessoa que perdeu um animal doméstico não vai receber nem o equivalente ao valor de um extravio de bagagem. Além disso, a mineradora usou referências de grandes empreendimentos agrícolas para determinar valores de produção de agricultores familiares na tentativa de reduzir os direitos destes atingidos.

De forma geral, a ArcelorMittal reproduziu a lógica de priorizar seu lucro em detrimento da reparação justa para os atingidos. A população comemora os passos dados, mas também afirma que continuará em luta pelos seus direitos.

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