Texto da Medida Provisória segue para o Senado. Se for aprovado, o governo perde o controle sobre o setor energético brasileiro e a população deve arcar com o custo maior da conta de luz e possíveis apagões
Publicado 20/05/2021 - Atualizado 21/07/2021
Na noite da última quarta, 19, o Plenário da Câmara dos Deputados aprovou a Medida Provisória (MP) 1.031, que permite a privatização da Eletrobras, principal empresa de energia do País, através da venda de ações do governo na Bolsa de Valores. A venda da estatal deve resultar em contas de luz até 20% mais caras para a população, além da possibilidade de novos apagões como os que aconteceram recentemente depois da privatização da Companhia de Eletricidade do Amapá.
Foram 313 votos favoráveis, 166 contrários e cinco abstenções. O texto segue agora para o Senado. Na prática, se aprovada, a medida vai permitir que o Governo entregue o controle da estatal para o setor privado, perdendo-se a soberania energética do Brasil. Com isso, a companhia passa a ter fins lucrativos, praticando tarifas mais caras para a população.
De acordo com Dalila Calisto, da Coordenação Nacional do Movimento dos Atingidos por Barragens, a aprovação da MP é um golpe contra a classe trabalhadora brasileira. “Veja que a maior empresa de energia do país e de toda a América Latina, que representa um grande patrimônio público do povo brasileiro construído há quase seis décadas, está sendo posta à venda pelo governo federal, em plena pandemia, sem que a população brasileira compreenda do que se trata essa MP. Isso acontece sem a garantia de qualquer consulta e participação do povo”, argumenta a coordenadora.
“Estamos falando de umas das empresas públicas mais importantes do país e da América Latina, que tem uma importância central quando pensamos em qualquer política de desenvolvimento industrial e social para o Brasil no futuro.
Além de tudo isso, nós já sabemos concretamente no que resultará essa privatização: novos apagões, racionamentos, “tarifaços” na conta de luz e mais crimes socioambientais, rompimentos de barragens e contaminação dos rios. É um cenário de probabilidade de mais tragédias no Brasil, onde o direito à energia elétrica e à água potável dos trabalhadores fica sob ameaça”, complementa Dalila.
Entenda como irá funcionar a privatização da Eletrobras e suas consequências
Se aprovada, a Medida Provisória da Eletrobras deve significar um aumento de tarifa de cerca de 20% nas contas de luz das residências. A estimativa é feita pela Plataforma Operária e Camponesa para Água e Energia e pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) com base em dados da Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL).
Atualmente, a Eletrobras é vinculada ao Ministério de Minas e Energia, sendo que 62% das ações da companhia pertencem ao governo. A proposta enviada ao Congresso Nacional prevê a venda de parte destas ações na Bolsa de Valores, de modo a diluir a participação da União no capital social da estatal.
Segundo Fabíola Latino Antezana, diretora Coletivo Nacional dos Eletricitários(CNE), “vender a Eletrobras significará a privatização de 125 usinas de geração (51.125 MW), sendo 80% de base hidráulica, 71.000 quilômetros de linhas de transmissão e 366 subestações de energia elétrica”.
A privatização da estatal será acompanhada da assinatura de novos contratos de concessão para as usinas hidrelétricas por 30 anos. Esses novos contratos permitirão que que a companhia comercialize a energia produzida a preços de mercado, e não mais por uma tarifa regulada pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel), como acontece hoje. Atualmente, a maior parte destas usinas da Eletrobras vendem sua energia a um custo menor que as empresas privadas. Os dados da ANEEL revelam que o preço atual de venda da energia produzida por suas hidrelétricas é de R$ 65,30/1.000 kWh, enquanto as usinas privadas cobram o valor de mercado, que é em média R$ 250,00/1.000 kWh.
Fernando Fernandes da coordenação nacional do MAB ressalta que, ao se privatizar a Eletrobras, esta será autorizada a repassar essa diferença de R$ 185,00/1.000 kWh para os consumidores nas contas de luz em aumentos futuros. “Além de limitar o acesso da parte da população mais vulnerável do país a esse serviço essencial, esse aumento na tarifa de energia pode prejudicar a recuperação de pequenas e médias empresas no período da pós pandemia. Na verdade, neste momento, o governo precisaria apoiar a retomada econômica, especialmente de pequenos negócios e não criar novos entraves”, declara Fernando.
Além deste aumento de tarifa, o país também corre o risco de ter a qualidade da distribuição da energia prejudicada e viver apagões energéticos. Fernando cita como exemplo o apagão no Amapá, que deixou a população do estado sem luz por 22 dias. “Em menos de 10 anos de controle privado a Subestação de Macapá explodiu, incendiou e colapsou. O fato é que o apagão revelou um problema estrutural do modelo energético brasileiro.
Os serviços privatizados reduzem investimentos, cobram caro pela energia, não entregam a qualidade do serviço prometido e com o tempo, o sistema entra em colapso”.
Ao final do episódio, o conserto teve que ser realizado por empresas públicas que também custearam R$ 360 milhões em contratação de 150 MW médios de energia térmica por até 180 dias.
Esta é a segunda vez que o governo tenta privatizar a Eletrobras. A primeira ocorreu em 2018, na gestão Michel Temer, que enviou à Câmara dos Deputados o PL 9463/18 que acabou não sendo votado. Foi nesta época que a Aneel divulgou a estimativa de aumento tarifário em