Ação Civil Pública movida, há mais de seis anos, pelo Ministério Público Federal motivou a realização da audiência, que além dos indígenas dos povos Apiaká, Kayabi e Munduruku, conta com a presença de representantes da Companhia Hidrelétrica Teles Pires
Publicado 03/12/2020
A Justiça Federal em Mato Grosso (JF-MT), realiza hoje (2) uma audiência para abordar os impactos na água do rio Teles Pires, que afetam a vida dos povos indígenas atingidos pela Hidrelétrica Teles Pires (UHE-Teles Pires), localizada na fronteira dos estados do Pará e Mato Grosso.
A atividade vai ser realizada por videoconferência devido a pandemia da Covid-19 e faz parte de uma das fases do processo judicial, em que o juiz federal Ciro Arapiraca vai escutar representantes dos povos Apiaká, Kayabi e Munduruku, que vivem na região atingida.
O processo foi motivado pela Ação Civil Pública (ACP), feita, em 2014, pelo Ministério Público Federal de Mato Grosso (MPF-MT), que pede a condenação da Companhia Hidrelétrica Teles Pires (CHTP) e do Governo Federal, para o efetivo abastecimento de água potável aos povos.
Na época em que a ACP foi encaminhada à Justiça Federal em Mato Grosso, a usina de Teles Pires ainda estava em construção. Atualmente, o Teles Pires é o rio mais impactado por grandes hidrelétricas na Amazônia. Além da UHE Teles Pires, outras quatro grandes usinas foram construídas ao longo do rio: UHE Sinop, UHE São Manoel e UHE Colíder.
Em 2019, todas as usinas passaram a operar de forma simultânea impactando diretamente os povos indígenas, pescadores, assentados da reforma agrária e milhares de pessoas que vivem nas cidades ao longo do rio.
Há mais de 10 anos os indígenas pedem para serem escutados pela Justiça sobre as violações dos seus direitos, que vêm acontecendo devido a instalação das hidrelétricas, na região. Depois da ACP movida pelo MPF, em 2014, os indígenas, juntamente com o Fórum Teles Pires já realizaram uma série de denúncias públicas e representações ao MPF sobre os impactos das usinas.
“As barragens de Teles Pires e Colíder já mataram toneladas de peixes e milhares de animais. Abaixo das barragens, os peixes também estão morrendo em nosso território por conta das cheias e baixas repentinas do rio descontrolado, que já levou muitas canoas. Com a água suja das barragens não conseguimos mais pescar com arco e flecha, enquanto aumentam os problemas de saúde com a água contaminada, especialmente nas aldeias mais próximas das usinas. Até mesmo o baixo rio Juruena tem diminuindo a sua água de repente, afetando as aldeias Apiaká, quando a usina seca a água do rio Teles Pires.”, relata trecho da carta elaborada pelos povos Kayabi, Apiaká, Munduruku do baixo Teles Pires e Rikbaktsa do baixo Juruena, em abril de 2015.
Os povos indígenas da região do Teles Pires também elaboraram um dossiê com uma série de denúncias, em 2017, dos impactos das hidrelétricas evidenciando que os problemas não são ocasionados apenas por uma usina, mas sim por todas.
O Fórum Teles Pires elaborou uma representação ao MPF, em 2019, para pedir que a licença de operação da UHE Teles Pires não seja renovada sem que medidas urgentes fossem tomadas para garantir os direitos dos atingidos pela usina, “especialmente no tocante à qualidade da água, à biodiversidade e à integridade de ecossistemas aquáticos e florestais, com fortes repercussões sobre a cultura, a pesca, a segurança alimentar e outras condições básicas de saúde das populações locais”.
Pandemia
Devido a pandemia da Covid-19 a audiência judicial será realizada de forma remota. Um contexto desfavorável para as lideranças indígenas devido a falta de uma internet de qualidade nas comunidades.
Para não haver prejuízo da participação dos representantes dos povos indígenas, as lideranças Apiaká, Kayabi e Munduruku, participarão da audiência na sede do Ministério Público do Trabalho da cidade de Alta Floresta, em Mato Grosso (MT), que é o município mais próximo das comunidades.
O MT é o estado com o segundo maior número de casos registrados de óbito e contaminação dos povos indígenas pelo novo coronavírus no Brasil, segundo dados do Comitê Nacional pela Vida e Memória Indígena da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib).