Com atividades da Campanha “Plantando Vidas” em diversos estados e um ato nacional transmitido ao vivo, movimento celebra dia de luta e faz alerta contra devastação na região
Publicado 06/09/2020 - Atualizado 21/08/2024
Neste sábado (5), foi celebrado o Dia da Amazônia, data considerada importante para o conjunto dos atingidos por barragens, já que, para o movimento, a defesa da floresta é também a defesa da vida como um todo.
Por conta das restrições impostas pela pandemia de Covid-19 no mundo, o dia de luta neste ano foi diferente de outras edições, onde havia a possibilidades de manifestações nas ruas, sem a preocupação com a formação de aglomerações. Desta vez, o principal ato nacional ocorreu de forma virtual – em uma live organizada conjuntamente com outras entidades parceiras de atuação na região amazônica.
A denuncia das queimadas com o avanço do desmatamento ilegal e, por consequência, a expulsão e morte das populações locais como indígenas, quilombolas e ribeirinhos foi o central do evento que contou com a participação de lideranças locais, moradores da Amazônia, além de ativistas e artistas apoiadores da causa.
Além da transmissão nas redes sociais do MAB, o ato também foi assistido por seguidores das páginas das organizações: Mídia Ninja, APIB (Articulação dos Povos Indígenas do Brasil) , Terra de Direitos, Repam (Rede Eclesial Pan-Amazônica), CIMI (Conselho Indigenista Missionário), CTP (Comissão Pastoral da Terra), Amigos da Terra, International Rivers e CUT (Central Única dos Trabalhadores).
Destruição do bioma
Dados divulgados no mês de agosto pelo Inpe (Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais) dão conta de um aumento de 28% no índice de queimadas na floresta no mês de julho – foram 6.803 focos de incêndio em 2020, contra 5.318 focos registrados no mesmo mês em 2019. Os dados referentes ao mês de junho apontam o pior mês dos últimos 13 anos.
A ameaça do avanço do desmatamento tem uma relação profunda com a vida da população que habita os nove estados da região, em especial, os povos que estão presentes na floresta.
“Quem cuida de verdade das florestas são os povos originários, que estão lá, eles sabem como defender e tratar a floresta, preservam os rios, cuidam das árvores. Eles administram, mas é preciso dizer que essa riqueza imensa é para toda a humanidade”, afirma o teólogo Leonardo Boff, que acompanha o debate e participou do ato virtual.
Segundo relatório do Greenpeace, os focos de calor registrados no mês de julho estão mais presentes em terras indígenas. Foram 539 incêndios neste mês em 2020, e 305 em julho do ano passado – um aumento de 76%. As unidades de conservação ambiental também estão brutamente afetadas: foram registradas 1.018 queimadas, com aumento de 49% em relação ao último ano.
“Venho lutando há muito tempo pela demarcação, sei que o futuro precisa disso. Nós temos que cuidar da floresta para todos”, diz o cacique Juarez Saw Munduruku da aldeira Sawré Muybu, no Pará.
Com oposição explícita à proteção do ecossistema e da vida na Amazônia, o atual governo coleciona declarações de ataques aos povos indígenas e de apoio à derrubada da floresta; a síntese disso foi a famosa frase “temos que aproveitar para passar a boiada” dita pelo ministro do Meio Ambiente, Ricardo Salles, em reunião ministerial com o presidente Jair Bolsonaro.
Neta do histórico militante defensor da Amazônia Chico Mendes, Angélica Mendes também militante reafirma o compromisso de dedicação à preservação e faz um alerta. “Precisamos falar das consequências de destruir o bioma mais biodiverso que existe, temos que cuidar do futuro da humanidade, vidas indígenas importam, todas as vidas importam”, destaca Angélica Mendes.
Resistência dos povos locais
Além das falas de apoiadores da causa amazônica, o ato virtual trouxe depoimentos de lutadores da região com relatos de inúmeras violações dos direitos humanos.
“Vivemos aqui um verdadeiro genocídio com os grandes projetos, as hidrelétricas, a exploração da nossa força de trabalho para lucros de pequenos grupos estrangeiros. Sou atingida por Belo Monte e o que vejo aqui são oito anos de crescimento da extrema violência e miséria do meu povo”, relata Jéssica Portugal, militante do MAB em Altamira, no Pará.
A pescadora Marcela Andrade é atingida pelas usinas de Jirau e Santo Antônio, em Rondônia. “O nosso rio Madeira está completamente assoreado, não temos mais peixe como tínhamos antes e as empresas não dão nenhum tipo de suporte pra gente”, denuncia a atingida.
O avanço do agronegócio também afeta a vida de quilombolas. A maranhense Francinete Medeiros falou sobre essa realidade no ato. “Vivemos nessa disputa e temor de perder nosso território a qualquer momento. Precisamos dizer não a destruição do nosso solo sagrado, aqui nós somos atingidos pela monocultura do eucalipto e da soja. Estamos bem no meio desse avanço desenfreado, estamos em perigo”, desabafa Francinete.
O indígena Rozeninho Saw Munduruku ponderou a relação íntima de seu povo com o território.
“A Amazônia é importante, não só para todos os brasileiros, mas também internacionalmente, está tudo interligado, o ar, a natureza. Se, nós indígenas, perdermos a floresta, perdemos toda a nossa cultura, nós existimos na nossa relação com a floresta, ela é totalmente parte do que somos”, afirma Rozeninho Saw Munduruku.
Mundo de olho na Amazônia
Instituída em 2007, via legislação no governo Lula, a data de 5 de setembro tem por objetivo alertar a população para o tema da preservação. No ano passado, a reflexão sobre a temática da região amazônica foi tema do Sínodo (um encontro internacional de bispos presidida pelo Papa), demonstrando a importância da questão.
O Papa Francisco fez oposição à destruição do bioma amazônico e convocou o mundo para a defesa da Amazônia, que abrange, além dos estados brasileiros, outros países, sendo: Peru, Venezuela, Colômbia, Bolívia, Guiana, Suriname, Equador e Guiana Francesa – representando a maior floresta tropical do mundo com um total de 5,5 milhões de km² de extensão.
Atualmente, o governo brasileiro sofre duras críticas internacionais, com o tema na centralidade da pauta das relações internacionais, tanto políticas como comerciais com ameaças de boicote ao país, caso nenhuma medida seja tomada para conter o desmatamento.
Campanha “Plantando Vidas”
No ano passado, o Movimento dos Atingidos por Barragens inaugurou a campanha “Plantando Vidas” com o objetivo de plantar mudas de árvores em todos os estados onde o movimento está presente. O balanço inicial dá conta de mais de 40 mil mudas plantadas.
Confira as ações da campanha realizadas no Dia da Amazônia:
Rio Grande do Sul
No município de Erechim, no norte do estado, serão realizadas neste domingo (6) atividades unindo as pautas do Dia da Amazônia e do Grito dos Excluídos, celebrado no dia 7 de setembro. As ações consistem no plantio de 11 mudas de árvores nativas, no Reassentamento Passo da Conquista, onde residem atingidos e atingidas por barragens, em memória às vítimas da Covid-19 na região. Além disso, será organizada uma intervenção visual, em formato de varal, no Seminário Nossa Senhora de Fátima, trazendo fotos, faixas e cartazes em defesa da Amazônia.
São Paulo
Na sexta-feira (4), atingidos e atingidas por barragens plantaram cinco mudas de árvores em memória às cinco pessoas que morreram em decorrência da Covid-19 no município de Eldorado Paulista, no interior do estado. A mensagem que os atingidos passaram foi “enquanto o governo Bolsonaro destrói a Amazônia e despreza a vida humana, atingidos plantam árvores e preservam vidas”. O ato simbólico da Campanha “Plantando Vidas” ocorreu no Quilombos São Pedro e Galvão. Foram plantadas mudas de Jambolão, Ingá, Pitangueira e Cravo.
Rondônia
No sábado (5), em Candeias do Jamari, os atingidos da comunidade Paraíso das Acácias, plantaram mudas na comunidade. Em Porto Velho, os militantes do MAB colocam faixas em defesa e preservação da Amazônia em espaços públicos na capital.
Pará
O MAB realizou a entrega de 183 mudas de árvores nativas na cidade Marabá, em homenagem aos 183 mortos por Covid-19 na cidade, no sábado (5).
Em Belém, o movimento participou de um ato simbólico no bairro da Terra Firme, junto aos moradores da comunidade e vários movimentos comprometidos com a luta em defesa da Amazônia. Na ocasião, além de denunciar a destruição da Amazônia e reforçar a importância de sua preservação, foram plantadas mudas de espécies regionais no canteiro comunitário próximo Campus de Pesquisa do Museu Emílio Goeldi.
Na quinta-feira (3), os atingidos e atingidas realizaram uma ação de solidariedade na periferia de Ananindeua, na região metropolitana de Belém, em que foram entregues kits de higiene para as famílias carentes. Também foram entregues mudas de plantas regionais, como parte da campanha “Plantando Vidas”, alertando sobre a importância da defesa da Amazônia e do meio ambiente.
Na cidade de Itaituba, os atingidos também realizaram ações em defesa da Amazônia. Contra as queimadas criminosas e o desgoverno de Bolsonaro, o MAB realizou atividades na aldeia Praia do Índio do povo Munduruku e na orla da cidade.
Piauí
No sábado (5), em Teresina, os atingidos plantaram mudas no Parque Municipal Meus Filhos.
Ceará
Em Fortaleza, o MAB realizou uma ação simbólica na comunidade São Cristóvão, com o plantio de mudas de árvores, destacando a preocupação com a situação em que se encontra o Brasil, na gestão de Bolsonaro e do ministro Ricardo Salles e convocando a população para a defesa da Amazônia, dos povos da floresta, da vida do povo brasileiro e da soberania do Brasil.
Amapá
No município de Ferreira Gomes, o MAB realizou um ato em defesa da Amazônia e foram distribuídas mudas de plantas frutíferas para a comunidade, com a presença de representantes da CPT, REPAM, Guardiões Ribeirinhos, Levante, Quilombolas do Igarapé do Palha, Comunidade São Raimundo (Gato Preto).