Bolsonaro veta socorro financeiro para agricultores familiares durante a pandemia
O presidente Jair Bolsonaro (sem partido) vetou quase integralmente a proposta que prevê um auxílio financeiro aos agricultores durante a pandemia de covid-19. O recurso seria repassado para os produtores que não receberam o auxílio emergencial.
Publicado 25/08/2020 - Atualizado 25/08/2020
O texto, que havia sido aprovado na Câmara dos Deputados e no Senado Federal, também perdeu os trechos referentes à prorrogação de dívidas e linhas de créditos. Segundo o governo federal, o veto se deu por questões técnicas. De acordo com o presidente, o projeto não explica qual seria a fonte de onde os recursos sairiam, como determina a legislação fiscal. Bolsonaro usou a mesma justificativa para vetar auxílio sanitário às populações indígenas durante a pandemia.
O presidente também afirmou que os agricultores que precisarem de socorro financeiro devem tentar o auxílio emergencial de R$ 600. No entanto, pedir auxílio emergencial pode ter um custo alto aos trabalhadores do campo. Foi o que relatou ao Brasil de Fato o agricultor Maiquel Roberto Junges, de 36 anos, que atua numa pequena propriedade rural da família no município de Não-Me-Toque, região do Alto Jacuí (RS).
“Muito se falou nos R$ 600 [do auxílio], mas as nossas entidades aqui do Rio Grande do Sul orientaram os agricultores a não se inscreverem porque o aplicativo [do governo] não tem a opção ‘agricultor’. Só tem ‘autônomo’, então, se a gente se inscrever como autônomo, pode se desenquadrar de alguma outra política pública, como a previdência social ou mesmo um crédito oficial do Pronaf [Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar]. Então, nem isso chegou pros agricultores”, lamenta Junges, acrescentando que muitos camponeses estão atualmente sem condições de sanar as próprias dívidas.
A única parte que Bolsonaro não vetou foi a que permite aos agricultores pagar as parcelas da Cédulas de Produto Rural (CPRs) com produtos, como algodão e soja — a CPR é um título emitido pelo agricultor em nome da Companhia Nacional de Abastecimento (Conab), que tem financiamentos para a produção.
Agora, os vetos seguem para análise na Câmara e no Senado Para ser derrubado um veto, são necessários os votos da maioria absoluta dos deputados (257) e dos senadores (41).
O que sobrou da lei*:
1) Garantia de que o agricultor ou agricultora que se inscreveu no auxílio emergencial previsto no art. 2º da Lei 13.982, de 2 de abril de 2020, não perderá a condição de segurado especial – ou seja, é uma medida retroativa e inócua para os que não o fizeram, já que não há mais possibilidade de inscrição no auxílio emergencial.
2) Autorização, no âmbito do Programa de Aquisição de Alimentos- PAA, da quitação em produtos das parcelas vencidas ou vincendas de Cédula do Produtor Rural (CPRs) emitidas em favor da Conab por organizações de agricultores familiares cuja comercialização da produção tenha sido prejudicada pela pandemia. A quitação poderá ser realizada pela organização de agricultores familiares diretamente a entidade socioassistencial indicada pelo poder público.
O que Bolsonaro vetou:
• Foi vetado o auxílio emergencial de 3 mil reais, dividido em cinco parcelas de 600, que atenderia aqueles trabalhadoes e trabalhadoras que não aderiram ao auxílio emergencial, por não apresentar a estimativa de impacto orçamentário e financeiro (art. 113 do ADCT, não excepcionado pela EC106).
• Foi vetado o fomento de 2 mil e quinhentos rurais para agricultores em situação de pobreza, que poderia ser 3 mil para mulheres e 3 mil e quinhentos para projeto com cisterna ou outra tecnologia social de acesso à agua, por não apresentar a estimativa de impacto orçamentário e financeiro (art. 113 do ADCT, não excepcionado pela EC106).
• Foi vetada a concessão automática do Benefício Garantia-Safra por não apresentar a estimativa de impacto orçamentário e financeiro (art. 113 do ADCT, não excepcionado pela EC106).
• Foi vetado o Programa de Atendimento Emergencial à Agricultura Familiar, que garantia geração de renda de agricultores familiares e suas organizações ao mesmo tempo que garantia abastecimento emergencial de pessoas em situação de insegurança alimentar por meio da aquisição de produtos adquiridos da agricultura familiar.
As aquisição anuais do Programa seriam limitadas a 4 mil por família ou 5 mil se chefiada por mulher. Juntamente ao veto ao Programa, foi vetado o artigo que autorizava a prorrogação de dividas e suspensão de cobranças judiciais e execuções. As razões do veto são ausência de estimativa de impacto orçamentário e financeiro (art. 113 do ADCT, não excepcionado pela EC106).
• Foi vetada a possibilidade de rebates, repactuações e descontos para liquidações de dívidas relativas a operações de crédito rural relativas a débitos de responsabilidade de agricultores familiares até 30 de dezembro de 2021.
As razões do veto, além da ausência de estimativa de impacto orçamentário e financeiro (art. 113 do ADCT, não excepcionado pela EC106), é a inobservância do cumprimento da Regra de Ouro (inciso III do art. 167 da CF), que veda que as operações de crédito ultrapassem as despesas de capital, exceto aquelas autorizadas por meio de créditos suplementares ou especiais e aprovados pelo Poder Legislativo.
• As mesmas razões justificam o veto a criação de novas linhas de crédito no âmbito do Pronaf.
*Essas informações não constam na publicação original do Brasil de Fato, e foram elaboradas pela assessoria do PT no senado.