Novas medidas de reparação são aprovadas para atingidos pela Vale em Antônio Pereira, MG
Nova auditoria define que ZAS da barragem do Doutor tem uma área maior do que a calculada anteriormente
Publicado 24/06/2020
Ruína da igreja Nossa Senhora da Conceição, em Antônio Pereira, construída em 1716. Foto: Luiz Casimiro.
O distrito de Antônio Pereira está sob o risco de rompimento de mais uma barragem de rejeitos da mineradora Vale. A barragem de Doutor está no nível 2 de emergência desde o dia 1 de abril deste ano e foi constatado nesse mês de junho, por uma nova auditoria independente, que a Zona de Autossalvamento (ZAS) tem uma área maior do que a calculada anteriormente. Também neste mês, o Ministério Público Estadual (MPE) fez uma ação civil pública principal (ACP) para garantir os direitos da população atingida e que consta vários pedidos.
Dado o novo cenário, com o aumento da área de ZAS e a nova ACP feita pelo MPE, a juíza de Ouro Preto, Kellen Cristini de Sales e Souza, decidiu no dia 15 outras medidas de reparação que a mineradora deve realizar. Foi determinado o bloqueio imediato de 50 milhões de reais, totalizando 100 milhões de reais retidos até o momento. Este valor deve ser usado no pagamento dos danos decorrentes da remoção compulsória dos atingidos.
Além dos direitos já assegurados na primeira decisão da juíza, foi determinado que a Vale deve custear o auxílio emergencial a todos proprietários e moradores de imóveis localizados em toda a área ZAS. A Vale também deve custear assistência médica, psicológica e sócio assistencial às pessoas já removidas e as que ainda serão removidas, devido a nova área ZAS.
Foi determinada também a contratação de entidade multidisciplinar que seja independente em relação à empresa, para que elabore o Diagnóstico Social e Econômico e execute o Plano de Reparação Integral de Danos. Quem vai indicar essa entidade é o Ministério Público e quem fará a escolha dentre as indicações, será a justiça.
A decisão da juíza falhou ao não considerar as famílias residentes fora da área da ZAS, que não têm o direito à remoção e não se sentem mais seguras em suas moradias convivendo com a ameaça do rompimento. Além disso, o risco causa danos na comunidade relativos à moradia, saúde, trabalho, renda e agravamento da pandemia.
Em longo prazo, os atingidos e atingidas ainda terão que conviver com as obras de descomissionamento da barragem que tem prazo mínimo de duração de oito anos. Os danos decorrentes desta intervenção e de todas as mudanças já ocorridas na comunidade ainda são difíceis de mensurar. Por isso, é importante refletir se o valor estipulado pela juíza será suficiente para a reparação completa de todo o conjunto de danos materiais, imateriais, morais, individuais e coletivos.
Apesar dessas questões, a decisão da juíza representa uma importante conquista que ampliou os direitos dos atingidos e atingidas, reconhecendo que com uma nova área ZAS, mais pessoas serão atingidas, além da definição que o pagamento do auxílio financeiro emergencial deve durar até a reparação integral dos danos.
Mas ainda é preciso avançar, as famílias de Antônio Pereira estão assustadas com o aumento da mancha de inundação. Várias delas não concordam em sair de suas casas sem ao menos ter acesso a informações seguras. Elas não confiam na mineradora, querem entender como esses dados são produzidos e se são confiáveis, uma vez que só nesse ano já houveram duas correções nas análises feitas sobre a barragem Doutor. As famílias também querem ter segurança de que seus direitos serão garantidos ao saírem de suas casas, com prazos e compromissos firmados formalmente, sem a dependência total da mineradora.
Diante disso, os atingidos e atingidas de Antônio Pereira estão em situação de agravamento da vulnerabilidade social e da saúde física e psicológica. A mineradora ainda pode recorrer da decisão. Por isso, é preciso continuar a pressionar a mineradora, o poder público e o poder judiciário para que seja cumprida a decisão e para que a população de todo o território de Antônio Pereira seja reconhecida como atingida. É urgente que a Vale cumpra a lei e execute as medidas de reparação.
O povo de Antônio Pereira continua resistindo, se organizando e pensando ações simbólicas que podem ser feitas nesse momento de pandemia. A luta não pode parar porque só “A luta faz a lei!”.