Nota do MAB sobre matéria veiculada pelo jornal Valor Econômico em 30/09

Nota do Movimento dos Atingidos por Barragens sobre a matéria “Brumadinho vive entre a dor do luto e a satisfação do consumo”, veiculada pelo Valor Econômico em 30/09/2019 O crime […]

Nota do Movimento dos Atingidos por Barragens sobre a matéria “Brumadinho vive entre a dor do luto e a satisfação do consumo”, veiculada pelo Valor Econômico em 30/09/2019

O crime da Vale em Brumadinho completou 8 meses neste último dia 25 de setembro de 2019. Até o momento já são 270 mortos, sendo que 21 pessoas ainda não tiveram identificação realizada pelo IML. Toda a bacia do Rio Paraopeba está contaminada pela lama tóxica de rejeitos e milhares de vidas foram destruídas.

A matéria veiculada pelo jornal vem muito a calhar para a Vale, tendo sido publicada após somente uma semana da determinação judicial de Elton Pupo, Juiz da 6ª Vara da Fazenda Pública de Belo Horizonte, para que as partes da Ação Civil Pública apresentem novos critérios para renovação do auxílio emergencial, realizada no dia 24 de setembro.

– Em primeiro lugar, cumpre corrigir a matéria em um ponto essencial: a Vale não passou a “distribuir dinheiro para a todos os moradores”. O pagamento de um salário mínimo a todos os adultos (e meio salário mínimo aos adolescentes e um quarto de salário as crianças) que tenham residência em Brumadinho e em até 1km do leito do Rio Paraopeba até a barragem de Retiro Baixo é direito dos atingidos e atingidas. É fruto de luta da população e de acordo judicial, tendo em vista o estado de calamidade que se encontra a região – e a necessidade de tomada de medidas emergenciais imediatas que não trouxesse mais desastres para os atingidos.

– Os critérios impostos foram acordados por todas as partes na audiência do dia 20 de fevereiro, e requerem como comprovação uma quantidade extensa de documentos, e, para uma parte da população atingida, de difícil acesso. Ainda, os documentos deveriam ser anteriores à 25 de janeiro de 2019, justamente para que não gerasse uma onda migratória à cidade. Não é possível ignorar a informalidade fundiária em que vive a grande maioria da população brasileira, que nem sempre tem acesso a meios formais de comprovação de residência.

– Casos de fraude estão sendo apuradas pela delegacia do município de Brumadinho. De acordo com informações públicas, estes casos são poucos diante do grande número de atingidos que recebem por direito o auxílio emergencial: cerca de 90 inquéritos de apuração de fraudes para aproximadamente 120 mil atingidos que recebem o auxílio.

– Somente dos setores censitários das zonas primeiramente atingidas em Brumadinho – Parque da Cachoeira e Córrego do Feijão – a renda média mensal está entre R$410 e R$516. Uma subsistência informal, em sua maioria ligada direta e indiretamente de atividades econômicas dependentes da água: desde a pequena e média agricultura familiar, pesca artesanal e de subsistência, e serviços ofertados dentro desses círculos econômicos. Sendo uma população de baixa renda, que vive com menos de um salário mínimo, é natural que após o aumento da renda com o direito ao auxílio emergencial se busque melhorar as condições de vida. Quem não tinha um fogão, vai comprar.

Reforça-se a isso a necessidade de custeio com tratamentos psicológicos, remédios ansiolíticos e antidepressivos, aumento no número de doenças de pele e alérgicas decorrente do rejeito tóxico despejado por mais de 300km ao longo do Rio Paraopeba. Não está citado na matéria em questão que as lojas com maior aumento de vendas são as farmácias, assim como as lojas de eletrodomésticos. A razão é o aumento na venda de antidepressivos, em quase 60%, provocado pelo adoecimento mental em massa da população.

– Ao contrário do que aconteceu em toda a bacia do Rio Doce, após o rompimento da barragem de Fundão em Mariana, em que muitos atingidos após 4 anos do crime ainda não tiveram acesso a qualquer tipo de indenização e municípios inteiros se encontram em crise hídrica, financeira e de saúde, o auxílio emergencial vem como um primeiro passo para a reparação integral dos atingidos.

Se o ponto da referida reportagem é evidenciar qualquer tipo de ineficiência da medida adotada, a mesma deveria procurar os atingidos e atingidas para que os mesmos possam relatar as constantes violações de direitos. Além do não reconhecimento de grande parte dos atingidos, a Vale viola os direitos já conquistados e afirmados como legítimos. Falta pagamento do auxílio emergencial à muitas famílias, atingidos e atingidas que convivem até hoje com milhões de litros de rejeito tóxico ao pé de suas casas; distribuição de água potável para grande parte dos atingidos que não tem mais acesso à água do rio ou à distribuição da COPASA, o que gera a necessidade de compra frequente de galões de água para consumo humano; violação do direito à participação e informação; e criação de medidas de reparação que não visam o modelo integral e totalmente distante da necessidade real dos atingidos e das atingidas.

É importante, ainda, reforçar que não foi estimado o número de pescadores, ribeirinhos, agricultores, povos e comunidades tradicionais que dependiam da água para seu sustento em todo o Rio Paraopeba e que agora se veem expostos à vulnerabilidade financeira e de saúde.

O Movimento dos Atingidos por Barragens repudia a atuação parcial dos meios de comunicação com a publicação de matérias que beneficiam somente os interesses da Vale, uma vez que a matéria em questão do jornal Valor Econômico é uma entre muitas. A tentativa de apontar casos isolados como se representasse a maioria dos atingidos deixa claro a falta de profissionalismo e seriedade dos meios de comunicação em mostrar a realidade de Brumadinho e da vida da população vítima dos crimes de rompimento de barragens de rejeito.

Reafirmamos nossa solidariedade com as famílias das vítimas e com os atingidos e atingidas de todo o Rio Paraopeba e reforçamos que o auxílio emergencial é direito conquistado com luta. Que venham mais lutas, e ainda mais direitos. Pela Reparação Integral!
O Lucro Não Vale a Vida!

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