Atingidos por Belo Monte tentam barrar a privatização da água

Diversos movimentos sociais, instituições e autoridades estão se mobilizando para impedir mais um crime em Altamira (PA): a privatização da água. A prefeitura municipal pretende conceder a operação do fornecimento […]

Diversos movimentos sociais, instituições e autoridades estão se mobilizando para impedir mais um crime em Altamira (PA): a privatização da água. A prefeitura municipal pretende conceder a operação do fornecimento de água e tratamento e coleta de esgoto para uma empresa privada, em um processo conduzido às pressas, sem participação popular e sem que o sistema esteja funcionando plenamente.

O sistema de saneamento foi construído pela Norte Energia, concessionária de Belo Monte, como condicionante para a obtenção das licenças ambientais da hidrelétrica, já que um dos impactos previstos no Estudo de Impacto Ambiental (EIA) é a contaminação dos aquíferos locais.

O anúncio da privatização da água foi feito durante uma audiência pública realizada nos dias 5 e 6 de setembro. A audiência foi uma peça de propaganda coordenada por uma empresa privada de consultoria, Ernest & Young. Não se discutiu o plano de saneamento, mas o representante da empresa disse ter feito um “estudo” que comprava que o “melhor” modelo é a concessão privada.

Após denúncia dos movimentos sociais, o Ministério Público Estadual do Pará (MPE), Defensoria Pública Estadual do Pará (DPE) e Defensoria Pública da União (DPU) recomendaram que a prefeitura municipal de Altamira (PA) “suspenda imediatamente o processo de aprovação do plano de saneamento de Altamira, bem como o processo de licitação para a concessão do sistema de saneamento do município”. A argumentação dos órgãos é que o processo está sendo conduzido às pressas, sem a devida participação popular.

Além disso, a preocupação é que a instalação do sistema não está concluída. No dia 18 de setembro, aconteceu uma audiência pública na Câmara de Vereadores na qual a Norte Energia apresentou sua prestação de contas. De acordo com o balanço da empresa, 28% das casas da cidade ainda não estão conectadas à rede de abastecimento de água e 29,6% ainda não estão ligadas à rede coletora de esgoto. Além disso, são frequentes as denúncias de falta de água nos reassentamentos urbanos coletivos dos atingidos pela barragem e demais bairros.

Audiência de prestação de contas da Norte Energia na Câmara de Altamira foi marcada por cobranças com relação ao saneamento (18/09/2019)

A partir dessa audiência, foi lançada uma carta pública assinada por alguns vereadores, movimentos sociais e lideranças exigindo a paralisação do processo de concessão e a realização de “tantas audiências públicas quanto necessárias, com o fim de ser discutido com seriedade e representatividade da população a possibilidade ou não da concessão”. O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) também assinou esta carta.

Água é um direito

Os movimentos sociais estão organizando um abaixo assinado contra a privatização da água e esgoto, para que os moradores que estejam insatisfeitos com esse processo possam se manifestar.

Para o MAB, outra preocupação é com relação à tarifa a ser cobrada da população. “Fizemos um cálculo a partir dos valores do termo de referência do edital de concessão e vimos que uma família com quatro pessoas pode pagar até R$ 145 por mês, um absurdo para a realidade de Altamira”, afirma Jackson Dias, militante do Movimento.

“A concessão privada do saneamento vai contra o interesse público, pois a natureza da empresa é buscar lucro. Assim a tendência é a tarifa aumentar cada vez mais e a qualidade do serviço diminuir à medida que a empresa privilegie a remessa de lucros ao investimento em qualidade”, completa.

No estudo de Impacto ambiental (EIA) de Belo Monte, está escrito que o enchimento do reservatório de Belo Monte causa a elevação do lençol freático levando à contaminação dos aquíferos, inclusive dos poços de abastecimento de água (modalidade presente em 85% das residências na época dos estudos, em 2007).

Por isso, uma das condicionantes da hidrelétrica foi a implantação do sistema de saneamento básico em Altamira, a um custo que já chega a R$300 milhões. No entanto, a Norte Energia ainda não concluiu as instalações dos serviços, apesar do prazo inicial da condicionante ter vencido em 2013. A instalação do sistema também foi marcada por diversas disputas entre a concessionária da hidrelétrica e a prefeitura de Altamira.

Em outubro de 2015, a prefeitura conseguiu a aprovação do projeto de lei 3.206, criando uma autarquia municipal para gerir o saneamento, a Coordenadoria de Saneamento de Altamira (COSALT). Até então, o limitado serviço de fornecimento de água existente na cidade era responsabilidade da companhia estadual Cosanpa. O artigo 4º desta lei abriu a brecha para que a prefeitura faça a concessão do serviço para uma empresa privada sem a necessidade de passar pela Câmara Municipal.

Naquela época, a proposta enfrentou a resistência de movimentos populares, sindicais e estudantis, que conseguiram adiar por duas vezes a aprovação do projeto na câmara.

Conteúdos relacionados
| Publicado 21/12/2023 por Coletivo de Comunicação MAB PI

Desenvolvimento para quem? Piauí, um território atingido pela ganância do capital

Coletivo de comunicação Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) no Piauí, assina artigo sobre a implementação de grandes empreendimentos que visam somente o lucro no território nordestino brasileiro