Barragem de Acauã: inaugurado cemitério para comunidade de Pedro Velho (PB)
Foi inaugurado na segunda-feira, 13 de março, o cemitério São Sebastião, na comunidade de Pedro Velho, no município de Aroeiras (PB), a 200 km da capital. O campo santo receberá […]
Publicado 17/03/2017
Foi inaugurado na segunda-feira, 13 de março, o cemitério São Sebastião, na comunidade de Pedro Velho, no município de Aroeiras (PB), a 200 km da capital.
O campo santo receberá os restos mortais enterrados no antigo cemitério São José, que foi coberto pelas águas da cheia da barragem de Acauã, em 2004. O novo cemitério é resultado da luta do Movimento dos Atingidos pela Barragem de Acauã (MAB), com o apoio do Ministério Público Federal, que conduziu o diálogo entre comunidade, prefeitura de Aroeiras e Sudema, possibilitando a entrega da obra.
A solenidade de inauguração ocorreu à noite e teve a primeira parte conduzida pelo padre Giuzepe Marcondes, da paróquia de Aroeiras, que abençoou o novo campo santo. Além da comunidade de Pedro Velho, participaram da cerimônia o prefeito de Aroeiras, Mylton Marques, e lideranças políticas da região.
Enquanto a cerimônia ocorria, os olhos de Antonio da Costa Galdino observavam a área do cemitério. Ele ainda não sabia qual o local exato em que, finalmente, poderá enterrar os restos da sua avó por parte de pai. Antonio Galdino nasceu e se criou na comunidade de Pedro Velho, às margens do rio Paraíba. Na década de 90, sua avó foi sepultada no antigo cemitério São José, submerso pelas águas da barragem na cheia de 2004.
Por volta de 2010, após anos de seca, quando as águas da barragem diminuíram e as ruínas do cemitério apareceram, Galdino chamou um amigo, foi ao local, localizou a cova da avó e desenterrou os restos mortais. Eu sabia onde ficava a cova porque fiz um quadradozinho de tijolo, coloquei uma cruzinha com o nome dela, a data do falecimento, e ainda estava tudo lá. Eu disse ao menino é essa aqui, pode cavar. Tirei tudinho, os cabelos e restos das roupas dela, contou. Antonio Galdino depositou os restos da avó numa caixa de papelão, colocou a caixa dentro de um saco plástico e guardou num local coberto no quintal de sua casa. O pessoal disse para eu levar [os ossos] para enterrar em Aroeiras, mas eu disse que queria enterrá-la aqui, quando construíssem um cemitério no meu lugar, revelou.
A inauguração do cemitério também tem um valor especial para o morador Osvaldo Bernardo. Ele aguarda ansiosamente pelo momento em que poderá transferir para o novo cemitério os restos mortais dos parentes que estão enterrados em Aroeiras. Um dos parentes é o irmão de Osvaldo, Odilon Bernardo da Silva Filho, assassinado, aos 33 anos, numa emboscada, à noite, quando voltava para sua residência, após sair de uma conversa informal com amigos e militantes do MAB.
O crime ocorreu em 2009, quando Odilon foi atingido por tiros de espingarda disparados à queima roupa. Assim como Osvaldo, Odilon também integrava a coordenação do MAB de Acauã, numa época em que as lideranças do movimento recebiam ameaças. Após a morte de Odilon, Oswaldo entrou para o programa de proteção aos defensores dos direitos humanos. Para Osvaldo Bernardo, que também integra a coordenação nacional do MAB, o Ministério Público foi fundamental na luta da comunidade pela construção do cemitério. O MPF foi habilidoso em transitar na esfera municipal, dialogando diretamente com o prefeito e mostrando historicamente o compromisso que o MPF tem com a defesa da dignidade humana, declarou.
Direito de cultuar os mortos – Durante a cerimônia, o procurador regional dos direitos do cidadão, José Godoy Bezerra de Souza, falou sobre a importância do direito ao culto aos mortos, ressaltando que essa prática remonta à antiguidade. Fez um histórico do inquérito civil público sobre a barragem de Acauã, contando sobre o alagamento que retirou esse direito dos atingidos pela construção da barragem. José Godoy também relembrou de como, mais de dez anos depois da enchente, houve uma seca que permitiu que se tivesse acesso aos antigos cemitérios e elogiou a rápida ação de todos que aproveitaram a oportunidade para retirar os corpos e fazer a transferência. Esse é um aspecto da luta dos atingidos que foi contemplado, mas ainda resta muito a ser feito, ressaltou o procurador, lembrando das demais demandas das comunidades atingidas e do fato de estarem há muito tempo esperando as soluções.
Edvaldo de Brito, outro morador da comunidade de Pedro Velho, se engajou na luta pelos direitos das comunidades atingidas pela barragem de Acauã e é um dos coordenadores do MAB. Ele lembra que o novo cemitério deveria ter sido construído antes das obras da barragem começarem. O Estudo de Impacto Ambiental previa que fossem retirados todos os restos mortais para serem alojados num novo cemitério, mas nada disso foi feito [naquela época] e só foi feito agora por causa de uma luta histórica do MAB, frisou.
Memorial As ossadas desenterradas do antigo cemitério São José começarão a ser transferidas para o novo campo santo nos próximos dias. O cemitério São Sebastião também abriga um memorial onde vão constar os nomes dos mortos cujo reconhecimento pelos familiares não foi possível.
Um segundo cemitério será construído pela prefeitura de Itatuba, para onde serão transferidos os restos mortais do cemitério da comunidade do Cajá, também submerso em 2004 pela barragem de Acauã.
Barragem de Acauã O início da construção da barragem remonta aos anos 80. Sua fase final somente ocorreu por volta de 1999, sendo efetivamente concluída em agosto de 2002. Devido a fortes chuvas, após dois anos de construída, a barragem encheu em seu nível máximo, causando danos para os moradores que ainda se encontravam dentro da área a ser alagada e provocando o deslocamento de cerca de cinco mil pessoas que viviam às margens do rio Paraíba. Estudos realizados indicavam que demoraria, pelo menos, cinco anos para a cheia ocorrer.
Por: Assessoria de Comunicação
Procuradoria da República na Paraíba