População de Cuiabá protesta contra privatização da água

Por Keka Werneck, da Assessoria de Imprensa do Centro Burnier Fé e Justiça A Polícia Militar reagiu com violência contra manifestantes que participaram na quarta, dia 27 de julho, pela […]

Por Keka Werneck, da Assessoria de Imprensa do Centro Burnier Fé e Justiça

A Polícia Militar reagiu com violência contra manifestantes que participaram na quarta, dia 27 de julho, pela manhã no Centro de Cuiabá, de um grande ato público contra a entrega da Sanecap à iniciativa privada. Uma menina de 12 anos foi atingida por spray de pimenta nos olhos. Disparos de bala atingiram também outras quatro pessoas, entre elas Paulo Pacheco, de 28 anos, operador de máquinas da Sanecap. Ele saiu do ato para registrar Boletim de Ocorrência. A perna dele ficou totalmente tomada por marcas vermelhas.

A Polícia Militar já recebeu o coletivo, que vinha da praça Ipiranga pelas ruas do Centro, com armas em punho. O comandante da Operação, coronel Walter Silveira, disse que recebeu uma ligação da Prefeitura, para vir conter “um bando de baderneiros”. Perguntado se sabe dos motivos da manifestação, ele disse que não sabe e nem quer saber. “A polícia não faz o processo político, a polícia foi feita para proteger o patrimônio público e a integridade das pessoas”.

Conforme o comandante, as armas usadas são todas não letais. Com relação à menina atingida, ele disse que os pais dela podem procurar a corregedoria da Polícia. Com relação aos outros manifestantes atingidos, ele disse que vieram com violência e receberam violência. O clima ficou tenso no final da manhã. Os próprios manifestantes fizeram um cordão de isolamento, para evitar confronto mais grave com a polícia, que se mostrava nervosa, mas esses foram os primeiros a ser atingidos.

Para Pedro Aparecido, que ficou com uma marca vermelha de tiro na perna, na altura do joelho, a polícia demonstrou despreparo ao disparar, ignorando o processo democrático e o direito das pessoas de estarem indignadas e revoltadas. Pedro é presidente do Sindicato dos Servidores do Poder Judiciário Federal (Sindjufe-MT), um dos signatários do Fórum contra a Privatização do Saneamento e em Defesa da Sanecap. Segundo ele, a venda da Sanecap vai movimentar R$ 2 bilhões e será ruim para o povo. “Não se trata, portanto, de centavos”, destacou. Machucado e com as mãos trêmulas, ele perguntou para que serve a Polícia; “É para defender os políticos, essa quadrilha que está aí?” reagiu, indignado.

O presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Sanecap, Ideueno Fernandes de Souza, disse que os funcionários estão contra a entrega da empresa à iniciativa privada desde que isso começou a ser cogitado, “primeiro porque os trabalhadores temem demissões em massa e segundo que são contra o aumento da tarifa, o que fatalmente vai acontecer se ‘privatizar’”.

A Sanecap não pode ser privatizada, porque a Constituição Federal proíbe, em se tratando de empresa de serviços básicos como água e esgoto. Mas ela pode ser entregue à iniciativa privada, em forma de concessão, para que empresários explorem o setor por décadas.

Na prática, os movimentos sociais não vêm diferença entre uma coisa e outra. Para o professor Robinson Ciréia, da Central Única dos Trabalhadores (CUT), a população deve refletir sobre as outros setores que foram privatizados ou entregues à iniciativa privada. “O transporte é bom? Não! A coleta de lixo é boa? Não! As pessoas precisam tirar essa ideia da cabeça que privatizando as coisas melhoram, porque não é verdade”, destacou Ciréia.

No ato, os manifestantes, que deram duas voltas no Centro de Cuiabá antes de chegar à Prefeitura, gritavam que “a água é do povão, diga não à privatização!”, mostrando faixas, apitando e usando nariz de palhaço. Alguns levavam baldes. Quando manifestantes soltaram bombas, a coordenação do ato pediu, em público, através do carro de som, que parassem com aquilo, reforçando a intenção de que o ato fosse pacífico, embora forte politicamente.

A presidente do bairro Tancredo Neves, Inês Lopes, disse que o povo não está sabendo direito o que está acontecendo. Segundo ela, precisamos cobrar que a Sanecap preste um serviço de qualidade, mas não devemos deixar que ela seja vendida. “Os moradores querem água, mas não vão ter dinheiro para pagar contas caras e, se ‘privatizar’, pode esperar que isso vai acontecer”, disse a liderança comunitária, entre outras que também apoiaram o ato.

As pessoas que assistiam à manifestação nas ruas e comércios pareciam não entender bem o que estava acontecendo. A vendedora Diana Silva, 30 anos, moradora do CPA, explicou que ficou sabendo disso, porque viu em um ponto de ônibus um cartaz com o rosto dos vereadores que votaram sim, pela entrega da Sanecap. Na avaliação do vereador Lúdio Cabral (PT), que se coloca à frente dessa reação contra a “venda da Sanecap”, o ato é uma manifestação legítima, pacífica e temos que respeitar isso.

Ontem, 26 de julho, o juiz da 1ª Vara Especializada da Fazenda Pública de Cuiabá, concedeu liminar e suspendeu a votação que aprovou o projeto de lei, atendendo ao mandado de segurança protocolado por Lúdio, denunciando a manobra na Câmara. O magistrado reconhece, na decisão, que houve atropelos no processo legislativo. Por conta disso, os vereadores ameaçam cassar o mandato de Lúdio.

No final do ato, os manifestantes cantaram o hino nacional e chutaram, literalmente, os baldes, que haviam servido de símbolo durante a caminhada. Esse ato pela Sanecap uniu os movimentos sociais em torno da causa. No próximo ato, marcado para o dia 2 de agosto, justamente no dia em que a Câmara Municipal de Cuiabá volta a funcionar, os manifestantes vão questionar também a “privatização” da saúde e o risco de corte do passe livre.

 

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