CPT participa de audiência com ministra dos direitos humanos
Da Comissão Pastoral da Terra A Comissão Pastoral da Terra (CPT) participa de audiência com a ministra da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, para discutir a violência […]
Publicado 31/05/2011
Da Comissão Pastoral da Terra
A Comissão Pastoral da Terra (CPT) participa de audiência com a ministra da Secretaria Especial dos Direitos Humanos, Maria do Rosário, para discutir a violência no campo e os assassinatos de quatro pessoas na região Norte na última semana, nesta terça-feira, a partir das 11h30.
A Secretaria Especial de Direitos Humanos da Presidência da República convidou representantes da CPT para uma audiência que se realizará amanhã em Brasília, para discutir as ameaças de morte contra lutadores e lutadoras da terra e sobre a violência no campo e os assassinatos da última semana.
Em cinco dias foram quatro trabalhadores e trabalhadoras, defensores dos direitos dos camponeses e da floresta, os que tombaram diante do poder e da impunidade persistente nos rincões do Brasil.
O casal de ambientalistas José Cláudio e Maria do Espírito Santo, vinham recebendo ameaças desde 2001, segundo registros da CPT. Denúncias foram feitas aos governos estadual e federal, e mesmo assim a morte desses dois lutadores se concretizou.
Da mesma forma, Adelino Ramos, Dinho, trabalhador rural no sul do Amazonas, também foi morto enquanto vendia as verduras que produzia no assentamento onde vivia. Ele, sobrevivente do massacre de Corumbiara, em Rondônia, ocorrido no ano de 1995, denunciou no ano passado, em reunião com ouvidor agrário nacional, Gercino Filho, em Manaus, que estava jurado de morte.
E mais esse crime se concretizou. Já no dia 28 de maio, um assentado de 25 anos, Herenilton Pereira, foi encontrado morto perto do local onde o casal havia sido assassinado. Há indícios de que ele havia visto os motoqueiros que atiraram nos ambientalistas e, por isso, também foi morto.
A CPT vem há anos denunciando ações desse tipo em todo o país. Seu relatório anual, Conflitos no Campo Brasil, publicado anualmente há 26 anos, traz denúncias tanto de pessoas assassinadas e áreas em conflito, quanto de pessoas que são ameaçadas em todo o país. A morosidade do governo e dos órgãos de fiscalização competentes ajuda para que se mantenha esse grau de violência no campo brasileiro.
Segundo os dados da CPT, de 2000 a 2010, 1.855 pessoas em todo o país foram ameaçadas pelo menos uma vez (clique aqui para ver a lista).
Desse total, 207 pessoas foram ameaçadas mais de uma vez, sendo que 42 acabaram sendo assassinadas e 30 chegaram a sofrer tentativa de assassinato (clique aqui para ver a lista).
De 2000 a 2010, foram assassinadas 401 pessoas em todo o país.
Na audiência, a CPT apresentará mais uma vez ao governo essas informações, e mais detalhes do trabalho de coleta de dados relativos a conflitos no campo em todo o país que ela organiza.
Estarão presente Dirceu Fumagalli, da coordenação nacional da CPT, José Batista Afonso, advogado da CPT em Marabá, Paulo César Moreira, da CPT no Mato Grosso e Antônio Canuto, secretário da coordenação nacional da CPT.
Abaixo, leia a nota pública da CPT.
O Estado não pode lavar as mãos diante de mortes anunciadas
A Coordenação Nacional da Comissão Pastoral da Terra reputa como muito estranhas as afirmativas de representantes da Secretaria Estadual de Segurança Pública do Pará, do Ibama e do Incra que disseram no dia 25 de maio desconhecer as ameaças de morte sofridas pelos trabalhadores José Claudio Ribeiro da Silva e Maria do Espírito Santo da Silva, assassinados a mando de madeireiros no dia 24, em Nova Ipixuna (PA). O ouvidor agrário nacional, Gercino José da Silva Filho, chegou a afirmar que o casal não constava de nenhuma relação de ameaçados em conflitos agrários, elaborada pela Ouvidoria ou pela Comissão Nacional de Combate à Violência no Campo.
A CPT, que desde 1985 presta um serviço à sociedade brasileira registrando e divulgando um relatório anual dos conflitos no campo e das violências sofridas pelos trabalhadores e trabalhadoras, com destaque para os assassinatos e ameaças de morte, desde 2001 registrou entre os ameaçados de morte o nome de José Claudio. Seu nome aparece nos relatórios de 2001, 2002 e 2009. E nos relatórios de 2004, 2005 e 2010 constam o nome dele e de sua esposa, Maria do Espírito Santo. Pela sua metodologia, a CPT registra a cada ano só as ocorrências de novas ameaças.
Também o nome de Adelino Ramos, assassinado no dia 27 de maio, em Vista Alegre do Abunã, Rondônia, constou da lista de ameaçados de 2008. Em 22 de julho de 2010, o senhor Adelino participou de audiência, em Manaus, com o Ouvidor Agrário Nacional, Dr. Gercino Filho, e a Comissão de Combate à Violência e Conflitos no Campo e denunciou as ameaças que vinha sofrendo constantemente, inclusive citando nomes dos responsáveis pelas ameaças.
No dia 29 de abril de 2010, a CPT entregou ao ministro da Justiça, Luiz Paulo Barreto, os dados dos Conflitos e da Violência no Campo, compilados nos relatórios anuais divulgados pela pastoral desde 1985. Um dos documentos entregue foi a relação de Assassinatos e Julgamentos de 1985 a 2009. Até 2010, foram assassinadas 1580 pessoas, em 1186 ocorrências. Destas somente 91 foram a julgamento com a condenação de apenas 21 mandantes e 73 executores. Dos mandantes condenados somente Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, acusado de ser um dos mandantes do assassinato de Irmã Dorothy Stang, continua preso.
As mortes no campo podem se intitular de Crônicas de mortes anunciadas. De 2000 a 2011, a CPT tem registrado em seu banco de dados ameaças de morte no campo, contra 1.855 pessoas. De 207 pessoas há o registro de terem sofrido mais de uma ameaça. E destas, 42 foram assassinadas e outras 30 sofreram tentativas de assassinato. 102 pessoas, das 207, foram ou são lideranças e 27 religiosos ou agentes de pastoral.
O que se assiste em nosso país é uma contra-reforma agrária e é uma falácia o tal desmatamento zero. O poder do latifúndio, travestido hoje de agronegócio, impõe suas regras afrontando o direito dos posseiros, pequenos agricultores, comunidades quilombolas e indígenas e outras categorias camponesas. Também avança sobre reservas ambientais e reservas extrativistas. O apoio, incentivo e financiamento do Estado ao agronegócio, o fortalece para seguir adiante, acobertado pelo discurso do desenvolvimento econômico que nada mais é do que a negação dos direitos fundamentais da pessoa, do meio ambiente e da natureza. Isso ficou explícito durante a votação do novo Código Florestal que melhor poderia se denominar de Código do Desmatamento. Além de flexibilizar as leis, a repugnante atitude dos deputados ruralistas, que vaiaram o anúncio da morte do casal, vem reafirmar que o interesse do grupo está em garantir o avanço do capital sobre as florestas, pouco se importando com as diferentes formas de vida que elas sustentam e muito menos com a vida de quem as defende. A violência no campo é alimentada, sobretudo, pela impunidade, como se pode concluir dos números dos assassinatos e julgamentos. O poder judiciário, sempre ágil para atender os reclamos do agronegócio, mostra-se pouco ou nada interessado quando as vítimas são os trabalhadores e trabalhadoras do campo.
A morte é uma decorrência do modelo de exploração econômica que se implanta a ferro e fogo. Os que tentam se opor a este modelo devem ser cooptados por migalhas ou promessas, como ocorre em Belo Monte, silenciados ou eliminados.
A Coordenação Nacional da CPT vê que na Amazônia matar e desmatar andam juntos. Por isso exige uma ação forte e eficaz do governo, reconhecendo e titulando os territórios das populações e comunidades amazônidas, estabelecendo limites à ação das madeireiras e empresas do agronegócio em sua voracidade sobre os bens da natureza. Também exige do judiciário medidas concretas que ponham um fim à impunidade no campo.
Goiânia, 30 de maio de 2011.