Atingidos esvaziam audiência e reafirmam posição contrária à expansão da UHE Santo Antônio, em Rondônia

IBAMA e Santo Antônio Energia pretendiam fazer do evento chamado de “reunião pública”, uma audiência pública para consultar a sociedade sobre a intenção de elevação de 80 centímetros de altura […]

IBAMA e Santo Antônio Energia pretendiam fazer do evento chamado de “reunião pública”, uma audiência pública para consultar a sociedade sobre a intenção de elevação de 80 centímetros de altura da cota de água do reservatório da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio e expansão de mais 6 turbinas ao empreendimento. Distante do centro da cidade, o evento aconteceu dia 18 de dezembro, na Zona Leste de Porto Velho, na Avenida Guaporé às 17 horas. O horário determinado não convinha às famílias, que em muitos casos moram em comunidades localizadas a mais de 100 quilômetros de distância da cidade.

Na mesa estavam presentes represanteantes do IBAMA, do consórcio dominado pela Odebrecht, Santo Antônio Energia e o secretário municipal de planejamento (SEMPLAN) Jorge Elarrat. Esta composição já revela como transcorreu todo evento dirigido pelo diretor substituto da Diretoria de Licenciamento (DiLic) do IBAMA, Thomaz Miazak de Toledo. Enquanto estavam o coordenador fundiário, Ivan Silveira, o gerente de sustentabilidade, Guilherme Abbad e o diretor de sustentabilidade, Carlos Hugo Annes de Araújo, representando a empresa, nenhum representante dos atingidos foi convidado.

Entre a mesa e a população e ao longo das laterais se dispunham fileiras de policias armados, surpreendendo as famílias de trabalhadores atingidos e as autoridades presentes. Ao todo, eram cerca de 50 agentes da Polícia Militar, o que para a promotora do Ministério Público Estadual, Aidee Maria, representa uma tentativa de criminalização dos movimentos sociais. “Acredito que seja um absurdo ter esse forte aparato repressor numa reunião que deveria ser democrática.” Miquéias Ribeiro, atingido de São Carlos do Jamari e militante do MAB, contou que ele e outros integrantes do movimento chegaram a ser revistados pelos policiais nos banheiros.

 

Tratamento autoritário dado aos trabalhadores atingidos pelo IBAMA e Santo Antônio Energia

Cerca de 1000 moradores e militantes do Movimento dos Atingidos por Barragens de Jaci Paraná, Joana D’Arc, Morrinhos, Santa Rita, Riacho Azul, São Domingos, Vila Nova de Teotônio, Porto Velho e outras localidades, como São Carlos, do baixo Madeira, estavam presentes, entre representantes dos Ministérios Públicos Federal e Estadual, vereadores e outras representações.

Diferente do que está sendo divulgado pela empresa, não foi disponibilizado transporte para todas as áreas atingidas. Artur Raposo da Silva relatou que as famílias de Santa Rita não contaram com o transporte para participar da audiência. “A gente mora num reassentamento feito na beira do lago e para a empresa não temos direito a transporte pra discutir o aumento da cota, nem nós aqui no Santa Rita, nem as famílias do Morrinhos, onde até lote alagado têm, onde a própria Santo Antônio colocou!”.

O juiz federal Herculano Martins Nacif indeferiu uma medida cautelar impetrada pelo Ministério Público Federal e Ministério Público do Estado de Rondônia para suspender a audiência, devido a falta de divulgação previa, principalmente nas áreas atingidas, locais onde segundo a ação também devem ser contemplados com audiências públicas.

Diversos apontamentos foram feitos caso o aumento de cota ocorra, como o aumento de áreas alagadas, aumento na incidência da malária na região, mais famílias remanejadas, mas as informações eram imprecisas e não revelava como podem ser os impactos, o número de famílias atingidas, entre outros dados triviais.

Para a participação do público era necessário se inscrever em um papel que era encaminhado aos representantes do IBAMA, que convocavam arbitrariamente os participantes. Ao ser impedido de se manifestar, Océlio Muniz do Movimento dos Atingidos por Barragens convidou a se retirarem todos aqueles que não consentiam com a postura do IBAMA em legitimar as intenções da empresa naquela audiência. Assim uma multidão que já estava descontente com a falta de respostas aos seus questionamentos sobre os impactos com a elevação de cota e a resolução dos problemas já existentes esvaziaram a reunião.

Os atingidos sabem que não devem esperar pelo órgão licenciador, nem pelo arbítrio do poder judiciário, que recorrentemente têm atendido aos interesses do consórcio, em detrimento dos direitos humanos dos atingidos. Nesse sentido, é elucidativo o deferimento pela juíza Rosimeire Conceição dos Santos Pereira de Souza do interdito proibitório e o reforço policial no dia 17 de outubro, para tentar inviabilizar uma manifestação realizada por famílias organizadas com o MAB nos acessos à obra. Enquanto de dentro dos tribunais permanece difícil perceber que bairros inteiros e comunidades vêm sendo destruídas à beira do Madeira, seja pelo desbarrancamento, seja pela falta de peixe, os atingidos continuarão em luta.

 

População de Jaci Paraná indignada com os impactos já existentes

 

Posicionamento do Movimento dos Atingidos por Barragens sobre a intenção de aumento da cota do reservatório da UHE Santo Antônio e a suposta consulta pública

 16 de dezembro de 2013.

Somos contrários à intenção de expansão do reservatório da Usina Hidrelétrica de Santo Antônio, uma vez que o consócio Santo Antônio Energia ainda não apresentou como irá solucionar os inúmeros impactos já ocasionados pela obra e que continuam a se intensificar. Mesmo que muitos estejam previstos em condicionantes e existam programas específicos sobre os quais o empreendedor é responsável direto, como o Programa de Remanejamento da População Atingida e de Apoio às Atividades Pesqueiras, que visam restabelecer as condições de produção e geração de renda das famílias deslocadas e dos pescadores, respectivamente.

 

Mobilização de pescadores atingidos na BR 364

Entre os diversos pontos que exigimos resolução, conforme pauta já apresentada ao governo federal e a empresa, está a situação das famílias reassentadas, dos pescadores, a elevação do lençol freático em Jaci Paraná e os desbarrancamentos a jusante do barramento.

Mais famílias serão atingidas e estão sendo ameaçadas de remanejamento em localidades que já sofrem com problemas gerados pelo reservatório nas áreas de seu entorno, como a elevação do lençol freático em Joana D’Arc e Jaci Paraná, onde o abastecimento de água potável ficou seriamente comprometido.

Acessos comprometidos no Joana D’Arc

A Santo Antônio Energia anunciou no Joana D’Arc que mais famílias seriam atingidas pela elevação da cota, enquanto inúmeros casos de famílias atingidas que necessitam ser reassentadas continuam em aberto na mesma localidade. As áreas de reassentamentos rurais implementados pelo próprio consórcio estão à beira do reservatório, como é a situação do reassentamento Morrinhos onde há lotes com problemas de alagamento e encharcamento do solo.

Além de que a consulta pública deve acontecer em todas as comunidades ameaçadas, se esta for realizada no dia 18 de dezembro de 2014, não será previamente informada conforme rege a legislação vigente, pois não há diagnóstico confiável e de acesso público sobre o estado atual do reservatório. Também não há nada que apresente a evolução do reservatório ao longo do tempo, ou em qualquer período após a emissão da licença de operação, quando novos impactos se apresentaram, como o desmoronamento de cento e vinte casas no bairro Triângulo, expulsando muitas famílias.

Da mesma forma como as informações relativas ao reservatório atual, o Movimento dos Atingidos por Barragens já solicitou e retificou o pedido ao IBAMA da projeção das áreas a serem alagadas com a elevação da cota do reservatório da UHE Santo Antônio também, mas não fomos atendidos.

A apresentação dos dados indicados tem sido reivindicada incessantemente pelos atingidos junto ao Ministério Público Estadual e Federal e é parte de pauta já protocolada e encaminhada aos governos federal, estadual e municipal e ao consórcio Santo Antônio Energia.

 Em uma manifestação popular das famílias atingidas de Jaci Paraná, que bloqueou a BR 364, com mais de duas mil pessoas, no dia 24 de julho de 2013, entre os pontos de pauta foram solicitados os mapas que mostram a situação atual do reservatório. Sem respostas, no dia 23 de agosto, em audiência pública realizada em Jaci Paraná com o Ministério Público Estadual e Federal, Governo do Estado, Companhia de Águas e Esgotos do Estado de Rondônia, Defesa Civil Municipal, vereadores, lideranças comunitárias e cerca de 500 atingidos foram reafirmadas as preocupações com a elevação da cota sem acesso garantindo às informações que subsidiam o debate necessário e diante dos inúmeros impactos socioambientais aparentes e latentes. Tanto os empreendedores, quanto o IBAMA não se apresentaram na audiência.

Afirmamos que o monitoramento do reservatório não é confiável, pois desde o anúncio da construção das usinas, as empresas sempre apresentaram incertezas em relação ao número de atingidos e no seu discurso. No início uma tecnologia nova iria supostamente revolucionar os empreendimentos hidrelétricos, pois a utilização de turbinas do tipo fio d’água não acarretaria a formação de um grande reservatório e quase nenhuma famílias seria afetada. Já no PBA de Santo Antônio estimava-se 561 famílias. Em 12 de agosto de 2009 o consórcio afirmou publicamente que 1.145 famílias integram o programa de remanejamento. Em agosto de 2011 o número divulgado pela empresa era de 1.729 famílias. Com os eventos após o início da operação em 2012, no Triângulo, e os impactos acentuados no Joana D’Arc, há mais de 2000 famílias deslocadas. 

 

Famílias deslocadas pela Santo Antônio Energia

A evolução dos dados revela que a empresa apresenta um discurso pouco confiável

Mesmo que sejam apresentadas as informações, isto deve ocorrer previamente à consulta pública para subsidiar um processo de análise, debate e amadurecimento para a busca do consenso em todas as áreas afetadas e na sociedade.

É claro para o Movimento dos Atingidos por Barragens, a partir da experiência acumulada, em mais de 20 anos de organização nacional, e do que ocorre no rio Madeira, que os impactos socioambientais de uma Usina Hidrelétrica não evoluem de forma linear e precisam ser avaliados de forma integrada e sistêmica. Portanto a elevação de cota em 0,80 centímetros pode acarretar conseqüências de grande magnitude, somente em Jaci Paraná há cerca de 12.000 habitantes.

É preciso entender como irá se desenvolver os processos sedimentológicos a jusante, antes da possibilidade de intensificar os problemas de desbarrancamento, o efeito continuado de modificação do regime hidrológico e suas conseqüências na ictiofauna e na pesca artesanal, saber quem são as famílias ameaçadas, entre outras questões.

Entendemos que não deve existir pressa para aumentar os impactos, mas para resolver problemas gerados pelos já existentes. Esperamos que o IBAMA tenha aprendido com a licença de operação, que foi emitida sem um período de avaliação e logo mostrou as conseqüências da imprudência com a destruição das casas no bairro Triângulo. Também que esteja ciente da sua atual incapacidade de acompanhar os efeitos do empreendimento, mesmo sem a expansão ambicionada pela Santo Antônio Energia.

 

Casas desbarrancadas com os banzeiros gerados após a emissão da licença de operação

 

Movimento dos Atingidos por Barragens – Rondônia.

Água e energia com soberania, distribuição da riqueza e controle popular!

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