Arpilleras como voz e resistência: mulheres atingidas realizam intercâmbio na Bahia

Com apoio da Secretaria de Políticas para as Mulheres da Bahia, mulheres atingidas por barragens fortalecem sua luta usando o bordado como instrumento de denúncia e mobilização

Mulheres atingidas da Bahia utilizam Arpilleras como ferramenta de luta. Foto: Marcos Souza / MAB
Mulheres atingidas da Bahia utilizam Arpilleras como ferramenta de luta. Foto: Marcos Souza / MAB

Durante os dias 22 e 23 de agosto, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) promoveu um intercâmbio entre mulheres atingidas de diversas regiões da Bahia. Cerca de 30 companheiras das regiões Norte, Oeste, Chapada Diamantina, Recôncavo, Sudoeste e da Região Metropolitana de Salvador se reuniram na capital do estado com o objetivo de fortalecer a luta por direitos, compartilhar e denunciar as violações sofridas durante a ameaça e implantação de barragens e dos processos de enchentes, e articular suas pautas em nível estadual.

Militante do MAB no Oeste da Bahia, Maria José Sodré avalia que o espaço foi essencial para fortalecer a organização e as lutas das mulheres no estado. “É um espaço muito importante de formação e de fortalecimento, enquanto mulheres que se juntam para discutir a realidade de cada companheira presente, cada uma com suas especificidades e problemáticas enfrentadas nos territórios, seja pelos grandes empreendimentos, pelas ameaças ou pelos rompimentos de barragens.

Cada uma de nós traz uma experiência. E, quando a gente compartilha essa experiência, se fortalece e se identifica na luta da outra companheira. Assim, o Movimento fica mais forte.”

Para Jeiziane Brito, atingida pelas enchentes em Jequié, o espaço possibilitou compartilhar com as atingidas de outros municípios os dramas sofridos na cidade nos últimos anos. “Carregamos marcas severas das enchentes até hoje, e, quando nos reunimos com outras regiões, conseguimos encontrar nas mulheres, mesmo diante de desafios diferentes, a força que precisamos para continuar lutando.”

Utilizando as Arpilleras – técnica artesanal e política de bordado – como ferramenta de educação popular e denúncia das violações de direitos humanos, as mulheres atingidas, ao longo dos dois dias de encontro, puderam refletir e construir, de forma coletiva, narrativas visuais sobre as violências vividas com a ameaça e construção de barragens e outros empreendimentos: o rompimento com o território, a perda dos modos de vida, a destruição ambiental e as múltiplas expressões da injustiça social.

De acordo com Cleidiane Barreto, da Coordenação do MAB, o encontro possibilitou o fortalecimento da técnica das Arpilleras enquanto uma ferramenta de denúncia e memória. “Nós bordamos dores e sonhos e construímos peças que contam as nossas histórias, mas também contam as histórias do movimento, os objetivos, as conquistas e o que é ser uma mulher atingida. Então, as linhas, tesouras e tecidos carregam as nossas vivências e é uma forma de retratar as violações com arte e de fazer denúncia”, declara.

A atividade é resultado de uma parceria entre o MAB e a Secretaria de Política para as Mulheres do Estado da Bahia, com o projeto “Mulheres Atingidas Bordando a Resistência”, que tem sido desenvolvido com mulheres atingidas de dois territórios de identidade da Bahia. No Médio Rio de Contas, na cidade de Jequié, e no Norte, na cidade de Juazeiro, ambos municípios possuem barragens para produção hidrelétrica, sendo a barragem de  Sobradinho, em Juazeiro e a Barragem de Pedra, em Jequié, atingidos pelas enchentes intensificadas pelas mudanças climáticas, mas também pela abertura de comportas de forma irresponsável pela Companhia Hidroelétrica do São Francisco (CHESF).

Para Iandria Ferreira, membro da Coordenação do MAB na Bahia e coordenadora do projeto, a parceria com a Secretaria de Mulheres possibilitou “ampliar a visibilidade das lutas das mulheres atingidas por barragens no estado, além de denunciar as violações que essas mulheres sofrem com as enchentes ocasionadas pelas aberturas de comportas desses empreendimentos”. Além disso, promover o intercâmbio com outras regiões da Bahia “trouxe para as atingidas a dimensão da violação de direitos que as mulheres sofrem em diferentes espaços, mas com o mesmo modelo predatório de produção”.

Atingidas se preparam para exposição de Arpilleras. Foto: Marcos Souza / MAB
Atingidas se preparam para exposição de Arpilleras. Foto: Marcos Souza / MAB

O Projeto inclui ainda a produção de um minidocumentário e a realização de uma exposição com as peças de Arpilleras confeccionadas ao longo das oficinas. Essas ações têm como objetivo aproximar o público da dimensão humana dos conflitos ambientais, sociais, econômicos e políticos que emergem do atual modelo brasileiro de gestão dos bens hídricos e da geração de energia. Por meio dos testemunhos têxteis, serão reveladas as violações de direitos humanos e as diversas formas de violência enfrentadas pelas mulheres atingidas, dando visibilidade às suas histórias e resistências.

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