Audiência em BH (MG) cobra agilidade em estudos sobre contaminação da Vale na Bacia do Paraopeba
Além da demora na investigação, atingidos pelo crime em Brumadinho também denunciam falta de participação no processo de reparação ambiental
Publicado 17/12/2024 - Atualizado 17/12/2024
Aconteceu nesta segunda-feira dia (16), uma audiência na 2º Vara da Fazenda Pública e Autarquias de Belo Horizonte (TJMG), convocada pelo juiz Dr. Murilo Silvio de Abreu, para debater o andamento e acompanhamento dos Estudos de Risco à Saúde Humana e Risco Ecológico – ERSHE. Os estudos integram o processo de reparação ambiental sobre o crime da Vale em Brumadinho e tem o objetivo de dimensionar a contaminação por metais pesados na água e solo da região e propor medidas de reparação. Em janeiro de 2019 a barragem da mina Córrego do Feijão se rompeu, vitimando 272 pessoas e despejando 12 milhões de metros cúbicos de rejeitos de minério em toda a Bacia do Paraopeba.
Na audiência, o Grupo EPA – responsável pelo diagnóstico – apresentou a metodologia dos estudos e o andamento do processo. A investigação está dividida em quatro fases e a última delas deveria ser entregue no final deste ano. No entanto, apenas a primeira etapa foi concluída. Além disso, também foi adicionada mais uma fase ao processo, totalizando cinco etapas de pesquisa.
“Passados 5 anos ainda não finalizaram nem a primeira fase. Se pensarmos que tem mais 4 etapas, só vai finalizar esses estudos daqui 20 anos para aí ter o plano de ações da reparação e mitigação”, questiona Gleicilene Souza, moradora de Felixlândia, município da Região 5.
“A população atingida vai esperar mais 20 anos para saber se estão expostos a potenciais de contaminação? Quando que a pessoas atingidas terão o direito a exames especializados? E quando saberemos qual a real situação e quais medidas serão tomadas? Nós não temos esse tempo!”, indigina-se. Além do atraso, os atingidos criticam a metodologia aplicada na investigação e a falta de participação no processo.
Na avaliação de Fernanda de Oliveira Portes, militante do MAB, o atraso no processo de reparação ambiental é uma estratégia da mineradora para reduzir sua responsabilidade sobre o crime cometido.
“Desde o início a Vale ataca os estudos da perícia judicial, mas nunca apresenta planos de trabalho definitivos sobre a reparação ambiental”, aponta. Para a dirigente, o atraso no processo de reparação ambiental aumenta os problemas de saúde físicos e mentais entre os atingidos e posterga o tratamento adequado para a população, que segue incerta sobre a dimensão da contaminação vivenciada.
Para se ter uma ideia, um estudo divulgado neste mês pela Universidade Federal de Ouro Preto, realizado a pedido da Associação Estadual de Defesa Ambiental e Social (AEDAS) – entidade que assessora parte do território atingido – revelou a presença de metais tóxicos no ar em seis municípios da Bacia do Paraopeba: Betim, Mário Campos, Juatuba, São Joaquim de Bicas, Igarapé e Mateus Leme. Os estudos apresentaram níveis elevados de arsênio, cádmio, cromo, manganês, mercúrio e níquel, ultrapassando os valores de referência para qualidade estabelecidos por resoluções ambientais internacionais.
Diante da morosidade na reparação ambiental e dos impasses encontrados, o Movimento dos Atingidos por Barragens manifestou seu repúdio contra o processo e reforçou a necessidade da aplicação da Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB) para garantir acesso do povo ao processo de reparação ambiental. (Leia aqui a carta enviada no dia 13/12/2024)
“A presença dos atingidos na audiência como parte direta do acompanhamento foi importante, e precisa continuar como devido acompanhamento por parte das suas Assessorias técnicas Independentes. Mas é fundamental que os atingidos sejam ouvidos, foi agoniante nós não podermos falar, pois somos nós que vivenciamos os danos dessa contaminação”, avalia Michelle Rocha, moradora de Betim, município da Região 2.
Estiveram presentes na audiência o Comitê Científico do Projeto Brumadinho da Universidade Federal de Minas Gerais, CTC/UFMG, o perito do juiz, a AECOM – que faz o papel fiscalização como auditora sócio ambiental-, o grupo EPA – que executa os estudos no território-, a Vale S.A. responsável pelo rompimento, as Instituições de Justiça e representantes do Estado, as Assessorias Técnicas Independentes e os atingidos das 5 regiões da Bacia do Paraopeba. Ao fim da audiência, o juiz concedeu um prazo de 5 dias úteis para as Instituições de Justiça, Assessoria Técnica Independente e a Vale S.A. entregarem ao magistrado documentos e avaliações que possam contribuir com o processo para dar seguimento ao caso.
No próximo mês, quando o crime da Vale na Bacia do Paraopeba completará 6 anos, o Movimento dos Atingidos por Barragens realizará uma jornada de lutas com o mote: “Lei dos atingidos aplicar, pra reparação avançar”! As atividades ocorrerão durante os dias 24 e 25 de janeiro para denunciar as insuficiências do acordo de reparação. Os atingidos reivindicam a aplicação da Política Nacional de Direitos das Populações Atingidas por Barragens (PNAB) para o caso. Entre outros direitos a lei garante o Programa de Transferência de Renda (PTR), acesso à Assessoria Técnica Independente e às informações sobre todo processo de reparação.