Construção de usina hidrelétrica ameaça comunidades rurais e indígenas em Mato Grosso
Publicado 18/04/2022 - Atualizado 19/04/2022
Início dos anos 90. Em meio ao fluxo migratório em Mato Grosso, Isaqueu da Silva, 62 anos, e sua esposa, Cleuza Yakabe, 54, saíram do interior de São Paulo em busca de uma vida melhor. Ao atravessar a Serra de São Vicente, o rumo foi o município de Juara (MT), onde vivem como pequenos produtores na comunidade rural de Palmital desde 1994. Na época, o fluxo era comum no estado devido à busca por emprego e acesso à terra de qualidade para a lavoura.
Quase 20 anos depois, eles veem seus sonhos comprometidos com a chegada do tão prometido “progresso”. Sua família foi surpreendida com o projeto de construção da Usina Hidrelétrica de Castanheira, planejada para funcionar no Rio Arinos, que banha a cidade onde vivem. O empreendimento, que aguarda a Licença Prévia para sua construção, teve seus estudos iniciados em 2014 com o Diagnóstico Participativo da UHE Castanheira.
Após o conhecimento da Usina, Isaqueu problematiza cotidianamente seu futuro. “Hoje, nós vivemos preocupados com essa Usina que comentaram que vai sair. Todo o nosso trabalho dedicado, se isso vier a acontecer e com a idade que nós temos, não sabemos o que será. O povo todo que mora aqui tem acima de 60 anos. Comentam que vão indenizar. Mas pra que lugar nós vamos? A renda que nós produzimos dentro dessa propriedade é muito maior que os royalties dessa usina”, relata Isaqueu, preocupado com o futuro.
O receio de Isaqueu tem fundamento. Não é a primeira vez que sua família vive um drama relacionado às usinas hidrelétricas. Ainda no interior de São Paulo, quando residia na Ilha Dr. Carlos Botelho, popularmente conhecida como Ilha Capivara, teve a infância e a adolescência marcada pelos impactos causados pela Usina Hidrelétrica Engenheiro Sérgio Motta – conhecida como Porto Primavera,no Rio Paraná.
De onde nós saímos, nós tivemos um prejuízo alto com a usina. Quando se começou a construir as usinas hidrelétricas no Rio Paraná, nós começamos a viver um drama difícil, porque tudo que nós plantamos, que nós cultivamos, vinham as enchentes e perdíamos toda a lavoura.
Isaqueu da Silva.
Ele conta que, à época, tudo parecia divertido, sem dimensionar os impactos reais causados pela construção. “Trabalhava na roça, na enxada, plantava, colhia, muitas vezes perdia com inundações do Rio Paraná. Como nós éramos novos na época, a gente achava tudo uma aventura quando vinha aquelas enchentes, quando começaram a construir aquelas barragens, que nós perdíamos a nossa lavoura. Eu achava interessante, porque era uma novidade, entrava muito peixe, para comer o arroz, o milho, muito pacu, muita piapara. A gente nem pensava, nem imaginava. Perdemos muitos anos, perdemos muito nosso tempo”.
Isaqueu relata que somente hoje percebe os danos que a hidrelétrica causou para os moradores. Segundo revelou matéria da Folha, em agosto de 1997, o maior dano para as famílias afetadas foi social. Foram mais de 4.000 famílias afetadas diretamente pela obra, durante 17 anos. Ainda segundo a reportagem, de Rubens Valente, a agricultura ficou estagnada e os bancos se recusaram a oferecer empréstimos para financiar a agricultura, por causa do anunciado alagamento.
“Depois de muitos anos que nós ficamos sabendo, que quando era a época da colheita do povo eles abriram as comportas, para o povo perder suas coisas, ir desgostando e abandonando suas terras” denúncia Isaquel.
O drama do casal é compartilhado. Na mesa da cozinha, Cleuza relata seu passado, também marcado pelos impactos da hidrelétrica de Porto Primavera. Durante uma pescaria na região, ela sugeriu ao seu irmão ir até o local da Ilha Capivara, onde viviam. “Eu queria ver como estava”. Ao chegar no local, as memórias a fizeram recordar das marcas que a usina deixou em sua história.
“Pegamos um barco e descemos 20 quilômetros rio abaixo e chegamos na ilha onde a gente morava. Fomos passando os pontos, as casas dos amigos e a nossa casa. Dava pra ver o alicerce no fundo da água. Lembrei da figueira grande, que na sombra dela minha mãe tratava das galinhas, dava pra ver até alguns objetos, o cocho de pneu. A gente viu com tristeza um sonho acabado. Se não tivesse sido inundado, a gente veria pássaros, animais, vida. O que a gente viu foi um lago morto, triste e solitário, nenhuma vida, nenhum pássaro. Ainda, às vezes, eu sonho que estamos na Ilha e que ainda tem vegetação, o barranco, o rio, a vida. Tudo ficou só no sonho, na lembrança”, relatou.
Hoje, Cleuza teme viver essa mesma realidade caso a área em que vive, em Juara, também vire um lago solitário. O projeto da UHE Castanheira prevê o alagamento de 94,7 km². Desse total, no mínimo 70% de sua propriedade ficará alagada pela barragem.
Segundo ela, trata-se de um empreendimento pequeno para uma grande destruição. “Vai impactar muita terra para pouco lucro, porque nosso rio Arinos não suporta grande hidrelétrica”. Cleuza se refere ao custo-benefício da usina. Em 2018, a Conservação Estratégica publicou um documento intitulado “Análise Custo-Benefício da Construção da Usina Hidrelétrica Castanheira”, onde apontou que os benefícios que a UHE iria gerar em termos de energia não seriam suficientes para superar os custos de construção e operação do projeto.
Cleuza também relata sobre o valor da produção local das comunidades rurais Pedreira e Palmital que está em risco.
“Nós produzimos muito mais em leite, agricultura, carne, nós abastecemos todos os municípios dessa região. Todas as propriedades que serão alagadas são produtivas. Os laticínios falam que o melhor leite é dessa linha Pedreira e Palmital. Eles não sabem o que acontece aqui que o leite daqui é o melhor”.
Cleuza Yakabe
Conflitos socioambientais enfrentados por comunidades tradicionais e indígenas em áreas de influência dos reservatórios das usinas hidrelétricas no Brasil são uma realidade latente. João Romagna, 61 anos, relata que, para além dos danos sociais e econômicos advindos de impactos que a UHE Castanheira pode provocar nos moradores de Juara, o rio também corre perigo.
“Vai acabar nosso rio, vai morrer nosso Rio Arinos. Não vai mais existir aquele rio que nós, dia a dia, tomava banho. Vai ser um lago de água parada, cheio de madeira apodrecendo. A gente já esteve em Sinop e viu como ficou feio e eu calculo que aqui ainda pode ficar um pouco pior. Na conversa, dizem que vai ficar bonito, mas no papel é outra coisa”, relata ele.
João teme que o Arinos tenha o mesmo futuro que o Teles Pires. Na sub-bacia do Teles Pires, os impactos causados pela UHE Sinop são devastadores. O alagamento de quilômetros das duas margens, sem a retirada da vegetação, acabou afetando a qualidade da água, da fauna e da flora. As atividades da usina provocaram um enorme extermínio de peixes em 2020.
Segundo pesquisadores brasileiros, as usinas apresentam planos quase sempre autoritários ao buscarem sua legitimação em nome do progresso em detrimento do meio ambiente. Para se ter ideia, as barragens já alagaram 3,4 milhões de hectares de terras produtivas e desalojaram mais de um milhão de pessoas no país. Situação que tem se agravado a partir da privatização do Setor Elétrico Brasileiro, pois os investimentos provindos dos grupos multinacionais se disseminam, ou na obtenção das antigas empresas públicas, ou na constituição de inúmeros consórcios.
“Oficialmente, nunca fomos comunicados da hidrelétrica. Quando passaram por aqui, só foi pra tirar fotos. Nunca fomos consultados, só fomos saber depois. As decisões estão sendo tomadas sem ouvir as comunidades. Nossa escolha é continuar vivendo na nossa terra. Só nessa linha que está sendo prejudicada nós produzimos mais para o município do que a usina. Tudo que nós compramos pra produção é dentro do município e gera imposto para o município”, defende Lauro Taborda, presidente da Associação de Produtores de Pedreira e Palmital, que vive com sua família na comunidade.
Essa posição também é compartilhada pela família de Seu Jura, 61, e Dona Geni, 60, que revelam a inquietação diante de um cenário de incertezas e desinformação que cerca o projeto da UHE Castanheira. Muito emocionada, Dona Geni relata que às vezes não dorme mais de preocupação. “A vida da gente é aqui. Essa terra é a nossa vida. Como vou recomeçar minha vida com 60 anos? Não tenho estudo. Não temos outra história pra contar a essa altura da nossa vida. Vai ser um sofrimento pra nossa comunidade e para as comunidades indígenas que dependem do rio Arinos. Pra onde vai esse povo? Pra onde eu vou, pra onde a gente vai? Pra onde vão os indígenas atingidos? A usina é a morte, é a morte da comunidade é a nossa morte”.
Geni faz referencia às comunidades indígenas que vivem próximas à região do Arinos. Em depoimento à reportagem, a professora e pesquisadora Drª Lisanil Conceição Patrocínio defende que a UHE Castanheira, caso construída, deve atingir comunidades que margeiam o Rio Arinos, bem como os munícipes assentados e moradores do centro urbano. Ainda segundo ela, de sobremaneira pelas questões naturais, etnoculturais e antropológicas, deve impactar também a vida das populações indígenas Apiaká, Munduruku e Kaiabi (Kawaiweté).
“A PCHs deve cortar rios e passar no interior da comunidade Pedreira. Essa Usina Castanheira tem a proposição de gerar energia. Essa proposição em andamento para o Rio Arinos, tem como um dos seus afluentes o rio dos Peixes, que banha a Terra Indígena Apiaká-Kaiabi e faz parte da Bacia Amazônica e ameaça não apenas perdas de bens materiais, mas também, patrimônios imateriais” relata ela.
Para a pesquisadora, o maior impacto é com o patrimônio imaterial dos saberes indígenas, principalmente, sobre a relação dos mesmos com os rios. A denúncia alerta para o descompasso entre o discurso desenvolvimentista e a ameaça ao bem estar das comunidades indígenas e ribeirinhas que vivem na bacia do Rio Juruena/Arinos, sobre as quais os danos que poderão ser causados pelos empreendimentos hidrelétricos estariam sendo ocultados ou minimizados.
A reportagem apurou que a elaboração do EIA da UHE Castanheira não considerou o Estudo do Componente Indígena (ECI), que foi realizado somente após a sua conclusão. Como resultado, é provável que os impactos identificados no EIA não representem o total dos impactos gerados.
HIDRELÉTRICA
Em abril de 2016, alunos da Universidade do Estado de Mato Grosso (UNEMAT) se dirigiram para uma reunião na cidade de Juara (MT). Com o salão cheio de convidados, entre políticos e representantes de secretarias e sindicatos rurais, uma surpresa: tratava-se da entrega do Diagnóstico Participativo da Usina Hidrelétrica Castanheira em uma agenda que curiosamente não tinha a participação da comunidade.
“Quando chegamos ao local, a moça que estava apresentando disse: não falo mais. |Quem quiser que busque informações no site. Encerrou a reunião e foi embora. Assim, tivemos a notícia que Juara e outros dois municípios, Novo Horizonte do Norte e Porto dos Gaúchos, seriam impactados pela construção de uma usina hidrelétrica”, relata Michel Freitas, 35 anos, na época um dos estudantes.
O Diagnóstico Participativo a qual Michel se refere é o documento que reúne todas as informações fundamentais para o conhecimento das expectativas do futuro da população, incorporando a percepção dos participantes sobre a dinâmica socioambiental local acerca da construção da Usina Hidrelétrica (UHE) Castanheira. O documento começou a ser escrito em 2014, dois anos antes de parte da população do município de Juara tomar conhecimento do projeto de construção da usina.
Segundo relatos dos moradores locais, não houve identificação e conhecimento sobre o diagnóstico, embora visitas anônimas tenham sido feitas às comunidades do entorno de Juara para a elaboração do Estudo de Impacto Ambiental/Relatório de Meio Ambiente (EIA/RIMA). Para os moradores das comunidades de Pedreira e Palmital, em entrevista à reportagem, o anonimato era de parte da equipe da Empresa de Pesquisa Energética – EPE e do Consórcio das empresas Habtec Mott MacDonald e Nova Terra, responsáveis pelo estudo.
Segundo o documento oficial, publicado em 2016, os representantes que tiveram participação nas oficinas para a construção do Diagnóstico Participativo foram apenas da prefeitura – por meio de secretarias, câmara dos vereadores e UNEMAT. Participaram das oficinas membros dos Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Juara e Sindicato Rural de Juara, mas não houve a participação da população que possui relação direta com o Rio Arinos, seja por causa da pesca, da captação de água para abastecimento da população ou pelo lazer em suas ilhas.
Ao percorrer a estrada de chão avermelhado que leva o município de Juara às comunidades rurais, região que será impactada diretamente pelo alagamento da barragem caso a Usina seja construída, é possível observar as marcas deixadas pelos estudos do EIA. Com mais de 10 metros de altura, uma árvore paineira não esconde as marcas de uma estrada que irá desaparecer, quando a região se tornar totalmente submersa. O número 230 inscrito em branco no seu caule indica que aquele é o 230º ponto de alagamento. Para passar ali, será necessário navegar.
A Usina Hidrelétrica Castanheira está planejada para ser construída no Rio Arinos (bacia hidrográfica do rio Juruena), tendo sua maior parte da área do reservatório (99,96%) no município de Juara (MT), o que acende o alerta entre a população urbana e rural do município.
Segundo informação do site institucional da UHE Castanheira, a usina prevê uma potência instalada de 140 MW, com alagamento de 94,7 km2. Este alagamento prevê o impacto direto nas comunidades dos três municípios banhados pelo Rio Arinos, como é o caso das comunidades rurais Pedreira e Palmital.
Se efetivada a construção, as comunidades perderão parte significativa de suas terras produtivas, benfeitorias e suas histórias dos últimos anos, uma vez que a maior parte do reservatório previsto é composta por áreas de pastagem e floresta nativa.
Segundo denunciam membros de organizações da sociedade civil, pesquisadores, lideranças e população local, o projeto está sendo desenvolvido sem o devido dimensionamento dos impactos socioeconômicos, tendo em vista que as regiões que serão amplamente alagadas são majoritariamente responsáveis pelas principais atividades econômicas do município, como a pecuária leiteira, de corte e o extrativismo vegetal praticado por pequenos produtores rurais.
São os pequenos produtores que abastecem o mercado local, aquecem a economia e contribuem substantivamente com a arrecadação municipal, gerando, trabalho, renda e efeitos positivos até no serviço público, uma vez que melhora o orçamento da região. Ou seja, além da perda ambiental e a necessidade de realocação, existiria a perda econômica.
No caso da perda econômica resultante do alagamento de áreas produtivas, a construção da UHE Castanheira implicaria numa perda anual igual a R$ 17 milhões e R$ 11 mil no caso das atividades de pastagem e extrativista respectivamente, segundo aponta Análise Custo-Benefício da Construção da Usina Hidrelétrica Castanheira. Ainda segundo o documento, no caso da atividade pesqueira, o projeto diminuiria a renda líquida de cada pescador profissional em R$ 19.794,24 por ano (preços de 2015). O valor deste impacto em 2017 seria igual a R$ 4 milhões.
PREOCUPAÇÕES: FACILITAÇÃO DA APROVAÇÃO DA LP E ABERTURA PARA NOVAS USINAS NA REGIÃO
Há, ainda, por parte de organizações e moradores, o receio com relação à tentativa de simplificação e facilitação dos processos de licenciamento ambiental, mesmo diante da ausência de documentação para a análise e aprovação da Licença Prévia, conforme apontou a SEMA. Em janeiro deste ano, o Conselho Estadual de Meio Ambiente de Mato Grosso (Consema-MT) aprovou a Licença Prévia para a construção da Unidade Portuária Barranco Vermelho, às margens do rio Paraguai, em Cáceres, Mato Grosso (MT). Apesar do apontamento de falhas técnicas, no qual teve um parecer da Secretaria de Meio Ambiente do Mato Grosso (Sema-MT), que apresentou 111 pendências, a licença foi aprovada.
Essa suposta facilitação para a aprovação de projetos com impactos ambientais em Mato Grosso também foi expressa em leis polêmicas, como o PLC 58, aprovado na Assembleia Legislativa de Mato Grosso, que libera a atividade de mineração e extração de garimpo em áreas de reserva legal. Ainda no mês de janeiro, o governador de Mato Grosso, Mauro Mendes, sancionou esta iniciativa e promulgou a Lei Complementar 717/22. Com isso, estão liberadas as atividades de garimpo em reservas legais, incluindo terras indígenas. Durante a tramitação, o projeto foi duramente criticado, com indicativo do Ministério Público de Mato Grosso de que seria inconstitucional e violaria o Código Florestal Brasileiro.
Outra preocupação expressa pela comunidade é que a UHE Castanheira abra brechas para o total aproveitamento do potencial energético da Bacia do Rio Juruena, que, se concretizado, pode chegar a 160 usinas de pequeno, médio e grande porte na bacia. Segundo a Operação Amazônia Nativa (OPAN), dos 160 projetos, 113 ainda não saíram do papel, o que “acende um sinal de alerta”. Comparando com os monitoramentos anteriores, de 2019 a agosto de 2021, por exemplo, houve aumento de 54% na instalação de novas Centrais Geradoras Hidrelétricas, com potência ainda menor que as PCHs.
Concordando, Michel Freitas afirma que “Castanheira será porta de entrada para outras hidrelétricas de grande porte na sub-bacia do Rio Juruena-Arinos, que não se encontra barrada por grandes usinas como a do Teles Pires, que matou o lago e tem mortalidade altíssima de peixes”.
Apesar da significativa geração de energia sinalizada pela hidrelétrica, representantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) temem os impactos adversos provocados pelo projeto de construção da UHE Castanheira. Segundo eles, os efeitos nocivos seriam maiores do que os benefícios que a usina irá gerar, sobretudo, para os moradores do campo. Ainda segundo o MAB, seria preciso avaliar o custo-benefício da construção da usina.
O MAB não é contra a construção da hidrelétrica. A problemática é como isso acontece e os direitos que são violados neste processo. É preciso compreender que não há necessidade de se construir uma usina de 1,2 bi de reais para gerar 90 MW. O problema neste caso não é a energia. Michel Freitas.
Segundo aponta o documento de Análise Custo-Benefício da Construção da Usina Hidrelétrica Castanheira, produzido em 2018 pelos pesquisadores Thaís Vilela e Pedro Gasparinetti, da Conservação Estratégica, “o investimento previsto para a construção desta usina, incluindo a construção da linha de transmissão, é de aproximadamente R$ 1,3 bilhões (preços de 2015) – valor que não inclui os custos associados aos impactos socioambientais que seriam potencialmente provocados pela implantação e operação desta usina […] os resultados sugerem que o projeto de construção pode não ser viável financeiramente”.
Gilberto Cervinski, da coordenação do MAB, em entrevista ao site Brasil de Fato em 2020, avalia que a real motivação para a construção da usina não é a demanda energética e sim os lucros que o empreendimento vai gerar para os envolvidos. “Interessa às multinacionais que produzem turbinas, aos bancos que fazem os empréstimos, às empreiteiras, etc. Geram empregos por 3 anos, mas lucram com a conta de luz por 30 anos”, alerta ele.
IMPACTOS AMBIENTAIS E SOCIAIS DA UHE CASTANHEIRA
Segundo o documento publicado em 2015, intitulado Estudo de Impacto Ambiental da UHE Castanheira, foram identificados 43 impactos ambientais e socioeconômicos relacionados ao empreendimento.
Dos 18 impactos socioeconômicos identificados no EIA, apenas seis foram considerados positivos, incluindo a geração de empregos e o aumento das atividades de comércio e serviço. No entanto, segundo relatório de custo-benefício, há estudos que questionam a relação positiva entre desenvolvimento econômico nos municípios sede e a construção de UHEs.
Ainda de acordo com o documento, entre os impactos negativos potenciais, são destacadas as emissões de gases de efeito estufa, a perda econômica gerada pela inundação de áreas produtivas e a diminuição da renda econômica dos pescadores profissionais existentes no Rio Arinos.
Questionada pela reportagem sobre a situação, a Secretária de Meio Ambiente do Estado de Mato Grosso (SEMA), responsável pela emissão da Licença Prévia (LP), afirmou que “O EIA foi protocolado pela Empresa de Pesquisa Energética e está disponível no site da Sema e que o processo ainda não foi avaliado e também não ocorreram audiências públicas sobre o empreendimento”. Ainda segundo a Secretaria, o órgão aguarda o envio de uma atualização das informações já solicitadas e acordada com a EPE para seguimento na análise do processo, este sem prazo.
O relatório de custo-benefício da Usina sugere que o projeto de construção seja analisado de forma comparativa a fim de que os trade-offs entre as diversas alternativas, incluindo outras fontes de energia, sejam avaliados. Hoje, a política energética brasileira baseia-se na Lei 9478/1997, que destaca a importância da sustentabilidade das soluções preconizadas, a utilização de energias renováveis, o uso eficiente da energia, a diversificação da matriz energética e a preservação do meio ambiente. A esperança que fica nas comunidades é que volte a reinar a certeza de que suas vidas não atingidas pelos impactos gerados pelas usinas.
Nota: Durante a apuração desta reportagem foram seguidos todos os protocolos de biossegurança contra à Covid-19.