O impeachment e a violência no campo: duas faces da mesma luta de classes
*por João Pedro Stedile A votação do impeachment, que está em uma semana decisiva, explicita os interesses das classes dominantes e a disposição delas em reverter os prejuízos decorrentes da […]
Publicado 13/04/2016
*por João Pedro Stedile
A votação do impeachment, que está em uma semana decisiva, explicita os interesses das classes dominantes e a disposição delas em reverter os prejuízos decorrentes da crise econômica mundial. É a luta de classes nos gabinetes.
O Brasil vive uma grave crise econômica, política e social, e, nesse cenário, o poder econômico quer recompor suas taxas de lucro. Mas aqueles que detêm esse poder não vão sair da crise sozinhos. Para isso, eles precisam acabar com as conquistas sociais, retirar direitos dos trabalhadores, privatizar as elétricas e o pré-sal, e implementar o projeto neoliberal.
Esse projeto das elites está sendo apresentado pelo PMDB sob a forma do que seria um futuro governo Temer. Então, o que está em jogo é se voltaremos ao neoliberalismo ou não. É para isso que eles precisam tirar a presidenta Dilma. E isso é elemento central da luta de classes, que se acirra.
Eu acredito que a sociedade se mobilizou e denunciou que o que está acontecendo é um processo político que têm motivações espúrias que nada têm a ver com o comportamento da presidenta Dilma e seu governo. E essa consciência está levando as pessoas às ruas em luta pela democracia, que é o que está em risco neste momento.
Segundo a avaliação de diversos analistas políticos que tenho acompanhado, o Governo vai perder na Comissão, mas vai ganhar no plenário da Câmara. Isso porque os promotores do processo ainda não conseguiram provar que a presidenta tenha cometido algum crime. Realizar pedaladas fiscais é um artifício contábil que todos os presidentes da República fizeram e que, dentre os atuais governadores, 24 deles já praticaram. Então, se isso for considerado um crime, também deveria ter impeachment de todos eles.
Acho que depois das votações, há apenas dois cenários possíveis. Se não houver golpe, a presidenta Dilma sai fortalecida, porém terá a missão de remontar seu governo a partir de outras bases. Remontar o ministério, agora em diálogo com as forças da sociedade, não apenas com os partidos, e retomar o programa que a elegeu em outubro de 2014. Eu espero que Lula seja o coordenador desse processo.
Se houver golpe, entraremos em um governo de crise com desfecho imprevisível, pois 80% da população não aceita um governo Temer-Cunha-Mendes, nem um programa neoliberal, que vai trazer ainda mais problemas para o povo brasileiro. Então, se houver golpe, a crise política se aprofundará, e não haverá saída a curto prazo.
Longe do Planalto, a luta de classes usa armas de fogo. Em Quedas de Iguaçu (PR), a aliança entre oligarquias e governos locais matou dois trabalhadores rurais na última quinta-feira (7), justamente no mês em que relembramos os 20 anos do Massacre dos Carajás.
O que aconteceu no Paraná foi uma provocação organizada pelo secretário da Casa Civil do Governo do Estado, que tem laços históricos, financeiros e políticos com a empresa que grila a terra que pertence à União. Ele quis mostrar serviço aos seus patrocinados e promoveu a provocação que levou às duas mortes.
Essa tragédia demonstra como as elites reagem quando se sentem impunes. Foi nesse mesmo contexto que aconteceram, há 20 anos, os massacres de Carajás, Corumbiara, sem contar os massacres nas cidades, em pleno governo FHC. Porque a vitória político-ideológica do neoliberalismo nas urnas sinalizou às elites mais truculentas de que agora se pode agir de forma impune.
De nossa parte, não nos acovardaremos, porém tomaremos todos os cuidados possíveis para não cair em provocações nem em armadilhas da violência do latifúndio. Nosso papel como MST é o de seguir a luta pela reforma agrária. Seguiremos ocupando os latifúndios improdutivos. Seguiremos ocupando as terras de políticos, empresas e fazendeiros que estão em dívida com a União por sonegarem impostos e por não pagarem empréstimos em bancos públicos.
Sabemos que há mais de 5 milhões de hectares nessas condições em todos os Estados do Brasil, e que se poderia assentar mais de 130 mil famílias. Isso é o equivalente a todos os nossos acampados. E não será necessário que o governo gaste um centavo em indenização.
Seguiremos nossa luta por uma reforma agrária popular, que significa na atualidade, além de ocupar o latifúndio improdutivo, produzir alimentos saudáveis e sem agrotóxicos para toda a população.
E, no dia 17 de abril, faremos mobilizações em todo país. Afinal, é lei! Porque o governo FHC, envergonhado do massacre que aconteceu em 1996, decretou o dia 17 de abril como Dia Nacional de Luta pela Reforma Agrária, em um dos últimos atos de seu segundo governo. Não vai ter golpe! E vai ter Reforma Agrária.