Jornada de Lutas | Conheça a história da atingida Solange Barreto: “aprovação da PNAB é um sonho”

Moradora de Correntina (BA), Solange está entre os 2.500 atingidos que viajaram até Brasília (DF) para reivindicar a aprovação da Política Nacional do Atingidos Por Barragens – PNAB, que deve entrar em votação no Senado no próximo dia 07

Foto: Patricia Sousa

“Eu sonho que a gente consiga algo assinado, algo que a gente possa pegar e dizer assim: foi porque a gente lutou e foi para a rua, porque nos manifestamos. Agora temos aqui, nas nossas mãos, o que a gente tanto sonhou: um documento que garanta o direitos dos atingidos”.

Celebrar a aprovação da PNAB em Brasília (DF) durante a Jornada de Lutas do Movimento dos Atingidos por Barragens – MAB é, hoje, o maior desejo de Solange Barreto, moradora de Correntina (BA) e atingida pelo agronegócio e pela barragem PCH-Correntina. 

Solange é militante do MAB há 11 anos e enfrentou 7 horas de estrada, em um ônibus, para chegar à capital e participar da mobilização, que segue até o próximo dia 07, com uma série de atos e manifestações e assembleias. O intuito da mobilização é dar visibilidade às reivindicações do Movimento, incluindo a aprovação PNAB (Projeto de Lei 2788/2019), que cria um marco regulatório para garantir os direitos dos atingidos. O projeto – que já foi aprovado na Câmara dos Deputados tem a proposta de coibir a violação sistemática de direitos humanos praticadas contra as populações atingidas, como o deslocamento forçado, a perda de meios de subsistência e a precarização da saúde coletiva.  A expectativa é que o texto do projeto de lei seja aprovado no Senado na próxima terça-feira, 07.

A agente de saúde, mãe de três filhos e dois netos, Gael (4) e a Cecília (2), a atingida se preocupa diariamente com o futuro da família, pois sente impactos das transformações promovidas por grandes empresas em seu território de origem, como o represamento e a exploração indiscriminada das águas dos rios da região “Antes, todo mundo tinha muita fartura, plantava todo tipo de alimento. Hoje, temos que escolher os alimentos que são plantados. Tem muita coisa que a gente não faz mais, porque não tem água. A água é bem pouca, então precisamos priorizar o uso principal: beber e cozinhar. Para cuidar dos animais e irrigar ficou bem pouca”, relata. 

Na região oeste da Bahia, a captação intensiva de água voltada para abastecer as empresas do agronegócio compromete o abastecimento dos moradores, especialmente ribeirinhos e comunidades de Fundo e Fecho de Pasto do município de Correntina. Situada no cerrado baiano, a região, conhecida pelo nome de Além São Francisco, ou Berço das Águas, passou a ser alvo das empresas da agroindústria a partir de 1970, incentivadas pelo Estado para modernizar o campo e produzir para a exportação. Desencadearam, assim, diversos conflitos ao tentar expulsar comunidades que viviam e produziam ali há séculos.

Apesar das opressões enfrentadas, Solange mantém a esperança em um futuro melhor e mais próspero para a comunidade que pertence. “O que mais vem no meu pensamento é lutar para que, lá na frente, o Gael e a Cecília tenham um futuro digno. Então, assim, eu quero deixar esse legado de luta para eles, para que eles também continuem na luta e possam dizer assim: olha aqui, a minha avó, ela fez algo por mim, né?”, finaliza emocionada.

Jornada de lutas em Brasília

Foto: Nane Camargos

Solange é uma das mais de 2.500 pessoas atingidas que estão em Brasília (DF) para a Jornada Nacional de Lutas do MAB, que acontece até o dia 7 de novembro. A proposta é dar visibilidade às principais reivindicações do Movimento: reparação, efetivação dos direitos e políticas de proteção social para os atingidos por parte do Estado brasileiro. Durante esses dias, atingidos de todas as regiões do país estão participando de atos, assembleias e reuniões para apresentar suas pautas para a população em geral e para diferentes órgãos do executivo e do legislativo.

A principal demanda do MAB hoje é a aprovação da Política Nacional de Direitos da População Atingida por Barragens – PNAB. A proposta que está em tramitação no Senado e deve ser colocada em pauta no próximo dia 7, define responsabilidades, formas de reparação e cria, também, mecanismos de prevenção e mitigação de impactos dos empreendimentos com barragens no Brasil. Se sancionada, a lei será considerada um avanço inédito no tratamento dos atingidos no Brasil.

Outra reivindicação do Movimento é a criação de um “Fundo Nacional Para a Reparação das Populações Atingidas” com foco em garantir recursos para projetos que previnam novas tragédias no Brasil relacionadas à construção, operação e rompimento de grandes obras (de represamento de água, mineração e produção de energia), a partir do envolvimento ativo da população na formulação das ações. O fundo também deve servir para lidar com prevenção de tragédias e reparação dos prejuízos causados pelas mudanças climáticas, como inundações, secas extremas e deslizamentos.

A data escolhida para iniciar a jornada, 5 de novembro, marca os oito anos do rompimento da barragem da Samarco (Vale e BHP Billiton) em Mariana (MG).. O Movimento espera sensibilizar o governo para que ele possa atuar efetivamente na reparação dos atingidos. Enquanto as empresas e o poder público discutem na justiça uma nova “repactuação”, os atingidos, defendem que haja participação popular em todas as etapas do processo.

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