Entidades da Plataforma Operária e Camponesa da Água e Energia e do Movimiento de Afectados por Represas participaram de debate sobre cenário energético internacional e fizeram ato contra privatização da Eletrobras
Publicado 29/04/2022 - Atualizado 01/05/2022
O Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), junto à Plataforma Operária e Camponesa da Água e Energia (POCAE) promoveu nesta sexta-feira, 29, um seminário preparatório para a Cúpula dos Povos/Rio+30. O evento – que aconteceu em formato híbrido (presencialmente no Rio de Janeiro e ao vivo pelo Facebook) – teve como objetivo discutir o tema “Energia para Soberania dos Povos” a partir da análise das políticas energéticas que estão em curso no continente latino-americano.
Participaram do evento representantes e ativistas de organizações do Brasil, Chile, Uruguai e Estados Unidos, que fizeram uma análise crítica da Política Energética no contexto mundial, latino-americano e brasileiro. Nesse sentido, os palestrantes apontaram as disputas em torno do modelo de produção, comercialização e consumo de energia no mundo. Também avaliaram os riscos dos projetos neoliberais de privatização e os aumentos abusivos dos preços das contas de energia e do barril de petróleo no Brasil.
Durante o encontro, as organizações também debateram sobre estratégias para fortalecer a soberania e o controle energético popular. Neste contexto, as entidades que integram a POCAE organizaram ainda um Ato Político Cultural contra a privatização da Eletrobras, que aconteceu em frente à sede da empresa, no Rio, durante o período da tarde.
As disputas em torno da energia
Em sua fala, a representante do MAB, Soniamara Maranho, destacou os principais fatores que influenciam no setor energético a nível internacional a partir da perspectiva POCAE e do Movimiento de Afectados por Represas – MAR, que envolve organizações de toda a América Latina. De acordo com a dirigente, os principais conflitos entre as potências econômicas globais que pretendem se apropriar das mercadorias, dos recursos naturais e do capital financeiro do mundo estão ligadas à questão energética.
“Quem possui as bases naturais de alta lucratividade no mundo hoje? Água, gás, energia, sol, minério, petróleo, carvão? O que vemos é que os países centrais e imperialistas consomem como alcoólatras esses recursos naturais, mas não detém nos seus territórios. Quem possui esses insumos são os países da periferia, especialmente da América Latina. Parte da Europa e África (Oriente Médio) também tem bases energética como petróleo e gás. Isso é o que desencadeia uma guerra pelo controle dessas bases energéticas estratégicas, uma base de alta lucratividade”, destacou Soniamara.
Na sequência, a pesquisadora chilena Ximena Quadra Montoya falou sobre as dimensões sociais e ambientais da política energética em seu país onde, segundo ela, o modelo energético é um dos mais neoliberais do mundo. De acordo com a Montoya, o país tem se utilizado do contexto da crise climática pra implementar “soluções” sob a ótica do capitalismo verde que aprofundam desigualdades sociais.
“Quem controla as crises climáticas também controla a economia verde. Um exemplo são os protocolos de Quioto e o Acordo de Paris, que teoricamente têm o objetivo de reduzir as emissões de efeito estufa. A questão é que eles incentivam o uso de tecnologias que não promovem justiça econômica, territorial e climática, mas, pelo contrário, aprofundam desigualdades. Estão criando falsas soluções ambientais pra lucrar a partir da crise climática”, afirmou.
Entre os exemplos dessa prática, Xiema mencionou o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que impulsiona a criação de novas usinas hidrelétricas e a produção de biomassa, gerando grandes impactos nos territórios indígenas no Chile.
O americano Sean Sweeney, que é diretor do Programa Internacional do Instituto Murphy, também questionou o conceito de “energia limpa” defendido pelos governos liberais. Segundo o ativista, para estimular uma transição da exploração dos combustíveis fósseis para um modelo energético chamado sustentável, muitos governos ao redor do mundo têm mobilizado grandes volumes de recursos públicos para que o setor privado venha a investir nas energias renováveis e nas soluções de baixo carbono através de subsídios.
“E isso tem sido um desastre fenomenal, porque as empresas querem garantia de retorno no mercado futuro através de contratos de grande prazo. A ‘descarbonização’ se pauta em um modelo de investimento privado focado no lucro que é um fracasso total, porque eles enxergam a energia como uma commoditie que compete com outras comomodities. Por isso, nós defendemos que a energia tem que ser pública, porque ela é um recurso estratégico pra sociedade e não pode ficar nas mãos de especuladores.
Ato contra a Privatizção da Eletrobras
Outra participante do seminário, Fabíola Antezana, diretora do Sindicato dos Urbanitários no Distrito Federal (STIU-DF), denunciou a falta de transparência do processo de privatização da Eletrobras que coloca em risco a soberania energética nacional.
A principal empresa de geração e transmissão de energia do país, que pode passar ao controle privado, tem capacidade instalada de 51.143 MW, o que representa 30% do total da geração elétrica do Brasil. Ao todo, a companhia detém 48 usinas hidrelétricas, 12 termelétricas a gás natural, óleo e carvão, duas termonucleares, 62 usinas eólicas e uma usina solar.
Fabiola apontou que a aprovação do projeto de privatização no Senado foi baseada na compra de votos com a promessa do investimento em termelétricas no país, na contramão do movimento mundial de reduzir emissões. “E nós sabemos que, além da emissão de gases de efeito estufa na atmosfera, a energia térmica tem um custo muito mais alto para a população”, avalia Fabíola.
No ato em frente a Eletrobras, trabalhadores ligados aos sindicatos do setor elétrico também denunciaram a precarização e a violação dos direitos dos funcionários, além do potencial impacto econômico que a operação vai causar para o país.
Na última semana, organizações sociais entraram com a ação na Justiça do Distrito Federal que pede que o processo de privatização seja suspenso até que o governo divulgue um estudo de impacto tarifário que prove que a conta de luz não sofrerá aumentos decorrentes da venda da estatal.