Carta de denúncias e reivindicações das mulheres do Tapajós
Nós mulheres da região do Tapajós, trabalhadoras do campo e da cidade reunidas no centro de treinamento do Laranjal em Itaituba no seminário Mulheres em Luta Construindo a Resistência * […]
Publicado 09/12/2016
Nós mulheres da região do Tapajós, trabalhadoras do campo e da cidade reunidas no centro de treinamento do Laranjal em Itaituba no seminário Mulheres em Luta Construindo a Resistência * viemos denunciar o conjunto de violações que já sofremos com o descaso do Estado e a ausência de políticas públicas. Com a chegada dos grandes projetos para essa região como Hidrelétricas, Portos e Mineração, nós mulheres já estamos vivenciando os impactos desses empreendimentos, alguns já em curso e causando graves violações de Direitos Humanos. Desta forma:
1-Denunciamos:
Os impactos dos portos na vida das mulheres com o tráfego de carretas, acidentes de trânsito nas rodovias BR 163 e BR 230 devido o fluxo de carretas, que já levaram a óbito várias pessoas (na sua maioria mulheres), a falta de assistência à saúde da mulher nas comunidades do interior e nos municípios da região, uma vez que os serviços públicos não conseguem atender a demanda devido ao aumento populacional, além da problemática do aumento da prostituição e da violência.
A violência contra a mulher tem aumentado no último período com diversos casos de feminicídio, e com a negação dos nossos direitos, o que por si só já é uma grande violência cometida pelo próprio Estado que não nos garante as condições de viver com dignidade.
Todo o processo de pesquisa para o licenciamento da hidrelétrica de São Luiz do Tapajós têm sido marcado por violações de direitos nas principais comunidades atingidas, principalmente para as mulheres de Pimental, Periquitos e São Luiz do Tapajós, com o desrespeito das empresas que chegam na comunidade sem consultar antes a população, geram conflitos, fazem grande pressão psicológica sobre as mulheres, além de não garantirem a devida comunicação sobre o empreendimento. Também temos a preocupação que as empresas mineradoras que pretendem se instalar na região repitam a mesma lógica de tratamento e de violação de direitos.
Temos também a preocupação com a segurança pública devido à violência instalada em Itaituba com os casos de assassinatos de mulheres e com a forma como a justiça tem lidado com essas questões, deixando uma sensação de impunidade para com os criminosos.
Com relação a saúde, é preocupante a situação de precariedade dos serviços de saúde. Os casos mais graves de urgência que são transferidos para Santarém sem as mínimas condições de atendimento devido à superlotação do hospital municipal de Santarém que recebe os pacientes dos municípios de toda essa região: Itaituba, Placas, Novo Progresso, Aveiro, Jacareacanga, Rurópolis e Trairão.
A educação nas comunidades é uma outra problemática que as mulheres da zona rural enfrentam devido à falta de compromisso do poder público. Alguns estudantes precisam se deslocar até o município de Itaituba ou Trairão para estudar, mas não há transporte público suficiente e as estradas e vicinais são precárias.
Denunciamos também os altos preços da tarifa energética, a má qualidade e os abusos da Celpa-equatorial. Não bastasse a tarifa de Celpa ser uma das mais caras do Brasil, o serviço prestado é ineficiente, e a cobrança das tarifas é cheia de vícios e ilegalidades que onera as trabalhadoras e trabalhadores.
Todo esse quadro pode se agravar ainda mais se a PEC 55 for aprovada, uma vez que ela visa retirar ainda mais direitos da população com o congelamento no investimento em políticas públicas por 20 anos. Somos contra essa PEC e todo o pacote de maldade que atinge principalmente nós mulheres. Também somos contra a proposta da reforma da previdência desse governo pois entendemos que ela só penaliza ainda mais as trabalhadoras e trabalhadores.
2-Diante desse cenário, reivindicamos:
Na área da Segurança Pública:
Construção de uma Casa de Abrigo para Mulheres Vítima de Violência;
Construção de um centro de referência, com atendimento jurídico e psicossocial para mulheres vítimas de violência;
Que a Justiça seja rigorosa, desvendando e punindo, conforme a Lei do Feminicidio e a Lei Maria da Penha, os que cometeram e vierem a cometer crimes de violência contra a Mulher;
Melhor estruturação delegacia da mulher, com a realização de concurso público para adquiri novos profissionais, treinamento dos profissionais para um atendimento de qualidade às mulheres vítimas de violência e compra de todo material necessário para o atendimento às mulheres;
Construção de uma efetiva política pública de proteção para mulheres;
Iluminação pública de qualidade.
Na área da Saúde:
Inauguração da UPA para melhorar a qualidade e saúde das mulheres;
CAMPANHAS mais EFETIVAS, contra o Câncer de Mama e do Colo Uterino e outras doenças que afetam as MULHERES;
Aquisição de UM APARELHO DE MAMOGRAFIA para a Casa de Saúde da Mulher;
CONVÊNIOS para que as mulheres sejam atendidas pelo Serviço público de Saúde, até que seja disponibilizado o Mamógrafo na SEMSA, para atender principalmente as mulheres carentes, já que a Lei lhes garante esse atendimento.
Continuidade das obras do hospital Regional em Itaituba.
Garantia do acesso a água de qualidade à toda população, seja urbana ou rural.
Na área da Educação:
Garantir que não sejam fechadas as escolas da zona rural;
Garantia do transporte escolar de qualidade e durante todo o ano letivo;
Garantir uma educação inclusiva e não discriminatória nas escolas, que ensine as crianças e adolescentes o respeito, e contribua para a prevenção da violência contra as mulheres;
Programas de capacitação técnica para as mulheres (curso de capacitação);
Construção de políticas públicas de esporte, cultura e lazer para a juventude.
Quanto aos grandes empreendimentos:
Somos contrarias a proposta de flexibilização do Licenciamento Ambiental para os grandes empreendimentos.
Consulta Prévia, Livre e informada conforme a convenção 169 da OIT- Organização Internacional do Trabalho, para os povos e comunidades tradicionais que serão atingidas pelas Barragens do complexo hidrelétrico do Tapajós, pela construção dos portos em toda a região do tapajós, bem como por qualquer empreendimento que cause impactos socioambientais.
Realização de uma audiência pública para que as empresas que pretendem construir portos na região apresentem o projeto para a sociedade para que seja possível debatê-lo antes de qualquer estudo ou pesquisa. No caso dos portos já instalados na região, como o da Bunge em Miritituba, que a audiência pública seja realizada para que a empresa apresente as condicionantes do licenciamento.
Quanto às demais políticas públicas sociais:
Elaboração de um Plano Municipal de Políticas Públicas para as Mulheres do Campo e da Cidade;
Programa de geração de renda para as mulheres;
Reativação do Conselho Municipal dos Direitos das Mulheres.
Acesso às políticas públicas para as mulheres da zona rural, assistência técnica, construção e manutenção de Estradas;
Garantir a regularização fundiária para famílias de pequenas e pequenos agricultores, ribeirinhos, pescadores, quilombolas e demais povos e comunidades tradicionais;
Que o Ministério Público dê continuidade às investigações sobre os abusos da Celpa e tome providências.
Itaituba, 8 de dezembro de 2016.
*Este seminário é fruto do processo de organização das mulheres da região do Tapajós através do projeto Direitos das Mulheres Atingidas por Barragens, realizado pelo Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) nos anos de 2015 e 2016, em parceria com a entidade de cooperação Christian Aid e apoio da União Europeia. A atividade foi construída em parceria com a Comissão Pastoral da Terra (CPT) e Terra de Direitos.
Participaram do Seminário as mulheres das comunidades de Pimental, São Francisco, Campo Verde, São Luis do Tapajós, Vicinal da 15, mulheres da cidade de Itaituba e dos município de Rurópolis e Santarém.