Agricultura camponesa propõe alimentos sem veneno

O debate sobre a produção de alimentos não é restrito à zona rural e pode interferir diretamente na saúde da população brasileira. Foto: MPA por Guilherme Weimann, do Brasil de […]

O debate sobre a produção de alimentos não é restrito à zona rural e pode interferir diretamente na saúde da população brasileira.

Foto: MPA

por Guilherme Weimann, do Brasil de Fato SP

A troca de uma única palavra por outra pode parecer um mero detalhe. Entretanto, em alguns casos, uma mudança simples pode representar, na verdade, uma transformação substancial em determinado conceito. Atualmente, o debate campesino vive intensamente essa questão.

Para a ministra da Agricultura, Pecuária e Abastecimento, Kátia Abreu (PMDB), a saída para alavancar o setor é o fortalecimento da agricultura familiar. O Programa “O Campo na Classe Média” pretende incluir 400 mil produtores rurais provenientes das classes D e E na faixa de renda da classe média.

De acordo com declarações da ministra, o projeto visa estruturar o acesso a tecnologias que potencializem a produção e, consequentemente, eleve a renda dos agricultores. Posteriormente, serão propostas ações de apoio, capacitação e incentivo à adesão em associações ou cooperativas.

Porém, essa estratégia é radicalmente oposta à concepção do Movimento dos Pequenos Agricultores, o MPA, uma organização popular de camponeses que atua em 19 estados das cinco regiões do país.

Foto: Douglas Mansur

De acordo com o dirigente nacional do MPA, Odair José de Souza, é necessário fazer a diferenciação dos projetos em disputa. “A cultura de confundir o que é agricultura familiar, camponesa e o agronegócio está sendo implementada há muito tempo. Nós falamos que agricultura familiar é o ‘agronegocinho’, porque para os produtores só muda a extensão da terra”, explicou Souza.

O movimento acredita que a política encabeçada pela ruralista Kátia Abreu baseia-se no modelo clássico do agronegócio, pois não há preocupação com a preservação da natureza, exclui a diversidade da produção, e incentivar a integração com a agricultura empresarial, subordinando esses pequenos produtores a grandes transnacionais do setor.

Além disso, é preciso destacar que as técnicas utilizadas nos latifúndios não possuem viabilidade econômica se transportadas para extensões menores de terra. De acordo com o IBGE, a pequena propriedade obtém uma renda média de R$ 677,00 por hectare, enquanto a grande propriedade alcança apenas R$ 368,00.

Para Souza, a população urbana precisa entender que esse debate não pode ficar restrito ao campo.

“Estamos discutindo com os trabalhadores da cidade a importância do tema. O povo brasileiro não se alimenta hoje, comemos algo que achamos ser alimento. É uma comida que não alimenta o bem estar e a alma e tem uma alta carga de porcarias. Temos que fazer a discussão do que está sendo consumido e de quem produz. E quem produz está respeitando a natureza e produzindo sem veneno?”, questiona o dirigente camponês.

Agrotóxico

Já imaginou ingerir um galão de cheio de veneno? De acordo o Instituto Nacional do Câncer, o Inca, essa é a realidade dos brasileiros. Em média, cada cidadão consome por ano 7,5 litros de agrotóxicos em decorrência do modo de produção agrícola.

O relatório afirma que o Brasil continua sendo o maior consumidor de agrotóxico do mundo, uma posição conquistada desde 2008. Segundo dados Associação Nacional de Defesa Vegetal, a Andef, este mercado faturou aproximadamente R$ 12 bilhões só no ano de 2014.

Atualmente, é difícil um produto comercializado no supermercado escapar dos agroquímicos. O “Dossiê Abrasco – um alerta sobre o impacto dos agrotóxicos na saúde” aponta que 70% dos alimentos consumidos no país são contaminados por agrotóxicos. Deste total, 28% contêm substâncias não autorizadas pela Agência Nacional de Vigilância Sanitária, a Anvisa.

De acordo com o Inca, parte dessas substâncias, como o glifosato e o malathion, é comprovadamente causadora de câncer. No caso das crianças, sujeitas à contaminação desde a amamentação, os riscos de desenvolvimento de leucemia e linfoma aumentam.

Por isso, de acordo com o dirigente do MPA, é necessário expandir o debate da soberania alimentar a toda sociedade. “A relação do alimento com a cidade tem que levar uma mensagem de classe, de luta. Através do alimento a gente abre portas para fazer um debate com os trabalhadores do campo e da cidade, no sentido de que temos que nos unir”, aponta Souza.

Como solução ao modelo atual, o movimento propõe uma nova forma de produção, denominada Plano Camponês, que pauta justamente o modelo da agricultura camponesa. O objetivo é propagar uma cultura que pressupõe a produção de alimentos saudáveis a partir de uma prática agroecológica, o respeito à natureza e a alimentação dos trabalhadores.

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