Opinião | ‘Apagar fogo’ com o fósforo na mão

Por que os rios transbordam em MG? A pergunta parece desnecessária e, a resposta, obvia. Mas não é!

Caso emblemático de Congonhas, região metropolitana de BH, conhecida por ser patrimônio mundial da humanidade, mostra, no micro mundo, ao menos dois elementos nefastos que agravam, substancialmente, o mal feito das enchentes no tempo chuvoso em todo o estado.

O primeiro elemento está associado, diretamente, ao padrão de exploração de minério no país. As mineradoras descobrem o topo das serras, constroem acessos e realizam grandes cortes em encostas íngremes, fuçam a terra igual porco em chiqueiro. Quando vem a chuva, parte desse material é carreado para os cursos de água, ficando aí depositado e, ao longo de um ano, contribui, enormemente, no seu assoreamento.

O histórico apetite financeiro das administrações nos municípios e no estado – por vezes até com boa intenção -, mas loucas por dinheiro e aumento na arrecadação, acaba fazendo ‘vista grosa’ a ‘pequenos’ grandes crimes ambientais e sociais. Aí mora o perigo! Nos últimos mandatos, Congonhas fez essa opção. E as mineradoras ficam à vontade, no máximo colocando a formalidade em dia para ‘inglês ver’, sem margem alguma para um controle social efetivo.

Nessa boa vida folgada, elas se orientam pelo critério do maior lucro – como é de praxe do capital , em detrimento do cuidado social e ambiental -, ainda que isso signifique despejar rejeito de minério num vale, onde corre água limpa, onde é área de lazer, com moradores logo abaixo e, com o passar dos anos, se forme um verdadeiro monstro chamado Casa de Pedra (CSN) sobre a cabeça das famílias; uma bomba relógio que, se romper, arrasa Congonhas e todas as cidades abaixo, ao longo da bacia do Paraopeba até sua foz, descendo, depois, pelo São Francisco.

O segundo elemento agravador do transbordamento dos rios em Congonhas, mas isso vale para muitos outros municípios também, tem relação direta com a administração atual. O discurso da nova política dá lugar ao amadorismo.

A questão é simples. Os mandatos passados faziam limpeza periódica nos rios Maranhão e Santo Antônio, roçando suas margens e enfiando máquinas pesadas em seus leitos, retirando, dele, toneladas e mais toneladas de lixo e entulho, desobstruindo a descida das águas. A administração atual não fez esse procedimento. Agora a população amarga pesadas consequências.

Pedro, o santo que cuida das chuvas, não fugirá de sua responsabilidade. Mas pouca coisa poderá ser colocada na sua conta.

Parte de Minas Gerais está debaixo d’água ou sofre deslizamento de encostas. Essa situação tem a ver com seu nome (minas de minério) e com sua exploração irracional.

As tragédias humanas despertam diferentes sentimentos, inclusive a solidariedade. Mas tragédias não ocorrem todos os dias. Nem são bem-vindas. Por isso quem tem a missão mais nobre de todas, que é ajudar na emancipação da consciência do povo para sua intervenção eficaz na realidade, precisa cultivar a sabedoria de saber despertar essa energia própria das tragédias no cotidiano da vida. Assim a participação qualificada e coletiva será coisa comum. As lições serão levadas a sério. E não se repetirão as mesmas catástrofes.

Somos bons apagadores de fogo. Agora precisamos exercitar como se ascende o fogaréu.

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